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Mauro Guilherme Pinheiro Koury
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Em uma enquete realizada sobre sujeira e imaginário social urbano no Brasil, em seis cidades brasileiras: João Pessoa, Recife, Belém, Brasília, São Paulo e Curitiba, entre os meses de abril e maio de 2009, foram perguntados a 390 brasileiros, entre outras questões, o que eles mais achavam sujo ou consideravam sujeira. As respostas foram várias, desde falta de higiene, até respostas homofóbicas e discriminatórias. Mas o que chamou atenção foi o grande número de respondentes que afirmaram a política brasileira como algo sujo, 26,6%. É sobre esse conjunto amostral, de 104 pessoas, que este artigo versará.
Os 26,6% de brasileiros que indicaram como sujeira a política brasileira, ao serem distribuídos pelas seis capitais de estados pesquisadas, se situam do seguinte modo: 23,4% da cidade de João Pessoa (PB); 38,3% de Recife (PE); 28,4% de Belém (PA); 21,1% de São Paulo (SP); 16,6% de Curitiba (PR) e 35% de Brasília (DF). O maior índice de indicação da política nacional como algo sujo foi encontrado entre os moradores da cidade do Recife, seguido de perto por Brasília. Os menores índices de indicação foram encontrados entre os respondentes de Curitiba, seguido pelos residentes na cidade de São Paulo.
As duas grandes categorias onde as diversas respostas individuais dos entrevistados foram agregadas, relativas à questão da política como algo sujo, falam da Falta de Zelo com a Coisa Pública, com 15,1% das indicações, e Desrespeito ao Cidadão, com 11,5% das respostas nacionais. Por falta de zelo com a coisa pública os entrevistados são claros na comparação da política praticada por políticos profissionais no Brasil como sujeira, nas esferas federal, estadual e municipal, pela indicação da corrupção ativa, e do legislar e agir em causa própria. Os escândalos que a sociedade brasileira vivencia desde os anos finais do século vinte até agora, como o de desvio de verbas públicas, o mensalão, a operação vampiro e outras, subornos, contratações ilícitas no congresso, enriquecimentos rápidos e inexplicáveis de políticos, uso da máquina pública para cabide das mais diversas práticas abusivas de beneficiamento da família ou pessoal, o eterno acabar em pizza das CPIs, os partidos como cabides de interesses estratégicos para uso pessoal, a falta de ética como fundamento partidário e da política no país, entre inúmeros outros, são apontados pelos entrevistados como sendo a prática política no Brasil. O que os fazem ter nojo da política e dos políticos no Brasil considerados, como disse um entrevistado recifense, “como um bando de porcos no chiqueiro, quando aparece alguma lavagem (a mistura de restos de comida com que são alimentados os porcos criados em fundos de quintais)”.
Por desrespeito ao cidadão, por outro lado, os entrevistados indicam, entre outras comparações, a de que os políticos “só aparecem quando querem se eleger, depois esquece o eleitorado”. Esta afirmação geral dada por um entrevistado da cidade de Belém sintetiza, grosso modo, uma boa parte das mágoas com a política por parte do homem comum urbano brasileiro. Essa queixa trás embutida outras tantas, que dizem respeito, principalmente, ao poder executivo. Embora, em muitos casos, revele ainda uma mentalidade clientelista por parte do eleitorado, da relação político-eleitor.
Promessas pessoais feitas durante a campanha para possíveis eleitores e depois esquecidas quando conseguem assumir algum posto no legislativo ou no executivo, são apontadas por alguns entrevistados, que se colocam descrentes do voto e aproximam a prática política da podridão, do político como aproveitador, da política como sujeira. Por outro lado, grande maioria das respostas reside no descumprimento de promessas de campanha para melhorias na infra-estrutura urbana, a partir do próprio bairro ou comunidade do eleitor.
Outro núcleo grande de indicações do desrespeito ao cidadão se coloca em alguns problemas de âmbito mais geral que atingem os moradores das cidades entrevistadas, como o episódio até hoje não resolvido do lixo na cidade do Recife, os problemas de transporte urbano, o estado de falência em que se encontram estradas, avenidas e ruas em todo o país, dificultando a circulação de automóveis e pessoas, aumentando o número de acidentes de trânsito e o trafego diário das vias públicas.
Outro conjunto de respostas indica a falta de iluminação pública, o que dificulta a circulação de pessoas, principalmente aquelas mais pobres, gerando medo. Outro aspecto associado como desrespeito ao cidadão, e indicativo da política como algo que dá nojo, fala da saúde pública, e das dificuldades do seu uso e do desaparelhamento dos hospitais e postos de saúde no Brasil; da educação formal e do esfacelamento da escola pública, nos três níveis, no país; falam ainda do distanciamento salarial dos políticos profissionais, bem como dos outros poderes, em relação ao salário do trabalhador comum, entre outros tantos aspectos.
Outro núcleo de indicações fala diretamente da questão do trato da violência como fazendo parte de um comércio e uma indústria mortal. Indicam os políticos em cargos legislativos e executivos como os responsáveis pelo acirramento da violência no país, não por falta de recursos aplicados, mas pelo desvio destes recursos, seja em propaganda, seja por outras formas: despreparo das forças públicas, falta de policiamento estratégico, desinteresse real da questão, embora com aparente interesse da eterna fonte de recursos para estimular este comércio e indústria nos municípios, estados e país, ampliando a cultura do medo entre os cidadãos.
Este núcleo que coloca a questão do trato da violência se desdobra por outra categoria indicada pelos entrevistados e que não será tratada aqui, que é a da Violência Urbana. Esta categoria, responde sozinha por 19,7% das indicações dos 390 entrevistados no Brasil que a visualizaram com sujeira. O que interessa aqui é mostrar a associação da política como um fato do desrespeito ao cidadão, inclusive no trato da violência pela res publica, isto é, como uma coisa do povo.
Em um ano pré-eleitoral, como 2009, onde começam a se encenar toda uma movimentação para renovação de cargos nos poder legislativo federal e estadual, bem como nos poderes executivos dos estados e do país, é interessante mostrar como a população brasileira vê e sente a política em desenvolvimento no país através dos seus políticos profissionais. A falta de ética, o uso pessoal e partidário da máquina política, o desrespeito ao cidadão, são apontados como problemas estruturais da política no país que levam a descrença do eleitor para o destino de seu voto: “em qualquer político novo ou antigo que se vote, ele assumiu o poder vira um safado igual aos demais que só pensa no seu bolso e no seu benefício”, sintetiza uma entrevistada de João Pessoa, e o fazem ver a política como algo sujo.
É bem verdade que uma pesquisa realizada em 2005 pelo Ibope, mostrou que 67% dos entrevistados diziam que se estivessem no poder faziam a mesma coisa que os políticos que lá estão: roubar e colocar a máquina política a seu favor. O que mostra o imaginário do jeitinho pessoal já tratado pelo antropólogo carioca Roberto DaMatta em vários ensaios sobre a forma de ser do brasileiro. Ou da expressão popular: “rouba, mas faz”, como forma síntese do político que se dá bem, mas também executa obras, tão comum na política nacional desde meados da década de cinquenta do século passado. Nunca, porém, a política foi tão mal vista no imaginário popular como nos últimos anos.
Em várias respostas os entrevistados ampliavam o seu argumento com a indicação do votar porque é obrigado, e da intenção de votar nulo ou em branco, pois todos os políticos, no fundo, são iguais: o que equivale a desonestos e que só pensam em si. Espelhando a desilusão com a política, com os políticos e com os poderes constituídos no país.
Em um país onde a democracia dá os seus primeiros passos para a sua consolidação e longevidade, esta desilusão para com a política pode ser fatal. É hora dos partidos e dos políticos novos e velhos repensarem a sua prática, e fazerem uma reflexão séria sobre o significado da política e sua relação para com a nação. 2010 pode ser um grande ano para se rever as bases reflexivas do que o Brasil quer e precisa.
E o homem comum brasileiro precisa deixar de lado amarras clientelísticas que o prendem a uma política do rouba, mas faz, e partir para uma reflexão sobre sua participação como cidadão na pressão consequente sobre os descaminhos da política no país. Precisa ter consciência de que pode ajudar a ampliar o nível de oxigênio da política do país, organizando resistências às práticas por ele consideradas sujas da política: afinal, são os homens comuns, cidadãos do país, que podem impor condições de permanência ou não da política como um negócio sujo.
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