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quinta-feira, 18 de junho de 2009

Série Pesquisas em Desenvolvimento, n. 03 (18 de junho de 2009)

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Este Blog publica, hoje, o terceiro número da Série Pesquisas em Desenvolvimento e Recém Finalizadas. Esta Série tem por objetivo a publicação e a divulgação dos Resumos Expandidos das Pesquisas em Desenvolvimento ou Recém Finalizadas pelo corpo de pesquisadores do GREM.
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Nesta Série, que teve o seu número 01 publicado neste Blog em 12 de junho de 2009, e o segundo publicado em 15 de junho de 2009, serão postados resumos individuais dos pesquisadores com um informe sobre suas pesquisas e uma pequena bibliografia referencial de apoio. Será informada, também, a linha de pesquisa do GREM a que estão vinculadas.
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O número 03 da Série Pesquisas em Desenvolvimento publica o Resumo Expandido da tese do pesquisador Luiz Gustavo Pereira de Souza Correia. O resumo apresentado neste 3º número da Série de Luiz Gustavo teve como objetivo a obtenção do título de Doutor em Antropologia Social pelo Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, em 2007. A pesquisa de Luiz Gustavo faz parte da linha de pesquisa Memória e Imaginário Social do GREM.
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Vamos, então, para o terceiro número da Série Pesquisas em Desenvolvimento e Recém Finalizadas.
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Título da Pesquisa Concluída: “A pupila dos cegos é seu corpo inteiro”: compreendendo as sensibilidades de indivíduos cegos através das suas tessituras narrativas

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Pesquisador: Luiz Gustavo Pereira de Souza Correia

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Resumo: Minha pesquisa de doutoramento, defendida no Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da UFRGS (CORREIA, 2007), nasceu como desdobramento de alguns questionamentos manifestados ainda durante o processo de feitura da minha dissertação de mestrado em Sociologia (CORREIA, 2002) - apresentada na UFPB sob orientação de Mauro Guilherme Pinheiro Koury - com o aprofundamento de algumas discussões e análises dentro do campo teórico da Antropologia Urbana e das Emoções. A cidade como ambiente de vínculos e enraizamentos de memórias individuais e coletivas, intercâmbios de sentidos e experiências, é o espaço das minhas inserções, a fonte das minhas inquietações antropológicas.
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Procurei compreender as vivências dos processos simbólicos e as interpretações pessoais sobre a perda da visão via narrativas de indivíduos cegos habitantes de Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul. Vinculadas a essa configuração temporal-espacial e simbólica estão as sensibilidades individuais e as suas expressões reveladas nas narrativas. A proposta foi investigar as camadas temporais simultâneas e distintas emaranhadas e recompostas nas memórias pessoais tecidas pelas narrativas dos sujeitos. Dessa forma, a tese se apresenta como uma síntese dos diálogos com esses diferentes personagens, a constante busca por articulação e troca de informações com essas outras percepções que povoaram minhas passagens em campo.
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O texto final da tese reflete as tentativas de compreender as interpretações pessoais dos sujeitos em interação com o espaço e com outros tantos personagens constituintes da cidade. Na busca por tornar mais fácil de entender alguns dramas humanos (ELIAS, 1995), se revelam os agentes enraizados na configuração social dada e as relações intersubjetivas vinculadas ao espaço e ao tempo vividos em sociedade. A montagem das experiências recontadas justapõe processos e rupturas pessoais contextualizadas pelas temporalidades citadinas, através das construções narrativas como elaborações onde os tempos das vivências e apreensões subjetivas se recompõem. Estas tensões, conflitos, articulações e rearranjos descobertos possibilitaram a ampliação dos sentidos das individualidades que planejava investigar em minhas primeiras caminhadas pelas ruas da cidade.
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O meu interesse foi mostrar a relação estabelecida entre as pessoas cegas “no” e “com” o seu espaço de vivência através de suas interações e articulações sociais na cidade. Parto do pressuposto do espaço vivido e apreendido afetivamente como lócus de configuração e enraizamento da memória pessoal e social dos sujeitos que nele convivem e da composição das diversas temporalidades nas trocas intersubjetivas urbanas. Penso, a partir das reflexões de Maurice Merleau-Ponty, que “não se deve dizer que nosso corpo está no espaço nem tampouco que ele está no tempo. Ele habita o espaço e o tempo” (1994, p. 193). É através do corpo como efetivação de uma consciência, ou melhor, de uma experiência, que há a comunicação com o mundo e com os outros. Assim, a cidade, seus espaços e ritmos, conformam um ambiente de intercâmbio de experiências múltiplas, individuais e coletivas, coesas ou conflitantes, mas sempre dinâmicas, que podem ou não acompanhar o ritmo que é próprio ao lócus urbano. O meu interesse foi então descobrir os espaços e tempos vividos na cidade, e de que forma se configuram as memórias e identidades dos sujeitos através do enraizamento das suas experiências nos diversos cenários urbanos à disposição.
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Tais observações seguem o caminho da valorização do cotidiano, da dinâmica das práticas e relações pessoais cotidianas, como noção base para a compreensão dos sentidos em jogo nas ações humanas. Situo-me a partir das contribuições de pesquisadores que propõem novas percepções sobre a estética urbana, valorizando a reapropriação da cidade, entendida como re-significação simbólica dos espaços e dos ritmos pelos diversos grupos humanos. Tais pesquisas buscam compreender de que maneira os atores sociais vivenciam, tensionam ou subvertem os códigos de conduta e sociabilidade urbanos (KOURY, 2003, 2005, 2006; MAGNANI, 1998, 1999; ROCHA, 2001; entre outros).
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Em conjunto com essa apreensão teórica da cidade, ressalto a preocupação com o caráter intersubjetivo da experiência (RABELO & ALVES, 1999). De tal forma, a experiência ganha contornos de vivência necessariamente intersubjetiva, com base nos sentidos acionados nas práticas cotidianas, nas interações em que a individualidade se torna perceptível. As individualidades – em suas relações na dinâmica do jogo social – expressas nos discursos narrativos surgem como aspecto fundamental para a compreensão da vivência urbana. Assim, pretendo reforçar o argumento sobre as fragmentações e articulações possíveis na composição da cidade tal como apreendida pelos seus personagens.
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Buscar as interpretações pessoais é uma forma de compreender a relação do indivíduo com o mundo com que e em que interage. Não o mundo panorâmico, contemplativo, perspectivado pelo olhar passivo que percebe de maneira homogênea e totalizadora. O mundo vivido, no entanto, como “cenário da vida do corpo, morada de afetos” (PESSANHA, 2000), é um mundo de espaço singular, “povoado por lembranças, sítio de experiências colorido por emoções datadas” (Idem).
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As narrativas expostas na tese, como elaborações discursivas das experiências pessoais e do processo de individualização dos sujeitos, são interpretações e significados atribuídos à vivência pessoal sem a visão no quadro de referências compartilhado formado pela cidade de Porto Alegre. Os sentidos expostos nas narrativas de tais elaborações individuais revelam a heterogeneidade própria às conformações humanas na sociedade contemporânea e de que forma a auto-imagem se estabelece a partir do processo tenso e conflituoso de delimitação de fronteiras sociais. A construção textual de tais relatos aborda a cegueira como um elemento comum aos personagens, sem buscar a caracterização de uma identidade coletiva, a configuração de um grupo humano específico.
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Tendo o corpo como terreno dos sentidos articulados e intercambiados no contexto socialmente vivido, a relação fundante do mundo intersubjetivo, do eu em relação aos outros, é revelada nos termos das experiências narradas da vivência cotidiana da cegueira. Na medida então em que é “dimensão do nosso próprio ser” (STEIL, 2007), é no e pelo corpo que se efetivam e se inscrevem as experiências e os projetos, que se pode pensar em modalidade particular de ser no mundo. O corpo do indivíduo é o meio por onde circulam e são agenciados, em sua relação com o mundo, os sentidos destas configurações. É a condição do indivíduo experienciar, criar vínculos, deslocar-se e elaborar os significados em sua relação com o mundo.
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Assim, as narrativas são montadas priorizando as especificidades de apreensão das experiências dos sujeitos. Dessa forma, se tornam compreensíveis as tensões, os conflitos, os diálogos, as semelhanças e distinções nas percepções próprias das experiências dos sujeitos nas dinâmicas das comunicações, negociações e apreensões dos sentidos socialmente compartilhados da falta de visão. Deixando aberto a outras possibilidades interpretativas e expondo os caminhos percorridos para estruturar minhas próprias reflexões. As contextualizações das narrativas estão em jogo no próprio ato de narrar, e, assim, tentei por uma das interpretações possíveis trazê-las ao corpo da tese.
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Referências
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CORREIA, Luiz Gustavo Pereira de Souza. Imagem fotográfica e memória social: o Templo de Angola Xangô Catulho Onicá no Zambe através de um acervo particular de fotografias. (Dissertação de mestrado). João Pessoa: PPGS-UFPB, 2002.
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____________. “A pupila dos cegos é seu corpo inteiro”: compreendendo as sensibilidades de indivíduos cegos através das suas tessituras narrativas. (Tese de doutorado). Porto Alegre: PPGAS-UFRGS, 2007.
ELIAS, Norbert. Mozart – Sociologia de um gênio. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2005.
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KOURY, Mauro Guilherme Pinheiro. Amor e dor – Ensaios em Antropologia Simbólica. Recife: Ed. Bagaço, 2005.
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____________. Medos corriqueiros e sociabilidade. João Pessoa: GREM/Ed. UFPB, 2005a.
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____________. Sociologia da emoção. Petrópolis: Vozes, 2003.
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____________. O vínculo ritual – Um estudo sobre sociabilidade entre jovens no urbano brasileiro contemporâneo. João Pessoa: Ed. GREM/ Ed. UFPB, 2006.
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LE BRETON, David. El sabor del mundo – una antropología de los sentidos. Buenos Aires: Nueva Visión, 2007.
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MAGNANI, José Guilherme Castor. Festa no pedaço: Cultura popular e lazer na cidade. São Paulo: UNESP/HUCITEC, 1998.
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____________. Mystica urbe – Um estudo antropológico sobre o circuito neo-esotérico na metrópole. São Paulo: Studio Nobel, 1999.
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MERLEAU-PONTY, Maurice. Fenomenologia da percepção. São Paulo: Martins Fontes, 1994.
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PESSANHA, José Américo Motta. “Bachelard e Monet: o olho e a mão”. In: NOVAES, Adauto. (Org). O olhar. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.
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RABELO, Miriam Cristina & ALVES, Paulo César. Experiência de doença e narrativa. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2003.
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ROCHA, Ana Luiza Carvalho. “As figurações de lendas e mitos históricos na construção da cidade tropical” In: Iluminuras, nº 34, Porto Alegre: Banco de Imagens e Efeitos Visuais, PPGAS/UFRGS, 2001.
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