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terça-feira, 7 de julho de 2009

Série Pesquisas em Desenvolvimento no GREM, n. 06 (07 de Julho de 2009)

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Publica-se, hoje, neste Blog, o quinto número da Série Pesquisas em Desenvolvimento no GREM. Esta Série tem por objetivo a publicação e a divulgação dos Resumos Expandidos das Pesquisas em Desenvolvimento ou Recém Finalizadas pelo corpo de pesquisadores do GREM.
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Nesta Série serão postados resumos individuais dos pesquisadores com um informe sobre suas pesquisas e uma pequena bibliografia referencial de apoio. Será informada, também, a linha de pesquisa do GREM a que estão vinculadas.
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Já foram publicados neste Blog os números: 01, em 12 de junho de 2009, o 02, em 15 de junho de 2009, o 03, em 18 de junho de 2009, o 04, em 22 de junho de 2009, e o 05, em 25 de junho de 2009, da Série Pesquisas em Desenvolvimento no GREM.
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O número 06 da Série Pesquisas em Desenvolvimento publica o Resumo Expandido da pesquisa em andamento no GREM, coordenada pela pesquisadora Alessa Cristina Pereira de Souza. Esta pesquisa tem como objetivo a obtenção do grau de doutor no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal do Ceará, Brasil.
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Vamos, então, para o número 06 da Série Pesquisas em Desenvolvimento no GREM.
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Título da Pesquisa: Construindo relações por entre os muros de um Centro Educacional
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Pesquisador: Alessa Cristina Pereira de Souza
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Resumo: O interesse deste trabalho recai, principalmente, na compreensão da construção de vínculos sociais e emocionais entre os adolescentes infratores, considerados como uma categoria de atores estigmatizada e excluída socialmente, trazendo para discussão as tensões geradas pelas condições sociais em que se encontram e as formas como percebem a si mesmos e aos demais, que compartilham o mesmo espaço físico, em um cenário que é representado aparentemente como igual, mas que essencialmente parece se compor como fragmentado, hierarquizado e complexo.
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Tenho em mente que a questão da infância e da adolescência abandonada já ocupava espaço de discussão entre o Estado, a igreja e as instituições filantrópicas desde o século XVII, na Europa; no final do século XIX e início do século XX essa temática começa a ter visibilidade, também, no Brasil. Não menos evidente é o interesse científico, lançado sob vários e diversos olhares, no século XXI, acerca dos adolescentes abandonados e/ou infratores, bem como, da delinqüência juvenil institucionalizada.
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A Sociologia também vem se preocupando com essa temática ao longo do tempo. Nesse sentido, são vários os termos, conceitos e classificações sociológicos criados para definir os espaços destinados a esses adolescentes, quando condenados a cumprir medidas sócio-educativas (1).
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Goffman (1999) denomina esses espaços como “instituições totais” e caracteriza-os pelo “fechamento” ou “clausura”, pela barreira estabelecida com o mundo social externo, através de elementos físicos, como: portas fechadas, paredes altas, arame farpado, fossos, pântanos ou florestas.
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Já Foucault (1999) compreende as prisões como “instituições austeras”, espaços dotados de mecanismos específicos – micropoder, que visam tornar os indivíduos “dóceis”, adequados ou “adestrados” à convivência social.
Outros sociólogos, que analisam esses espaços em dias mais recentes, tais como Wacquant (1997), Bauman (2005), Takeuti (2002) os vêem como depósitos ou armazéns de “refugo humano”, “lixo humano”, “vidas desperdiçadas”, provenientes do contexto sócio-econômico em que vivemos.
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Nesse contexto, os jovens vêem contribuindo intensamente para a produção, reprodução, aparecimento e desaparecimento de símbolos e significações. Entre esses sinais alguns repercutem de forma mais direta no imaginário social, quais sejam: os da violência acirrada, os da transgressão “sem limites” e da toxicomania generalizada, corroborando, assim, para a criação de um perfil de “infância perigosa” e, conseqüentemente, de uma “adolescência fadada ao fracasso”, destinada à criminalidade.
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Em meio a esse amplo cenário de discussões sobre o tema, minha proposta tem sido a de tentar capturar o objeto a partir de um ângulo imprevisto, inusitado (BOURDIEU, 1997). Nesse sentido, busco compreender os adolescentes infratores e internos a partir das relações e interações (sócio-emocionais) construídas por eles, no tempo/espaço/situação em que se encontram, bem como, perceber quais as influências que estas trazem para a construção de suas identidades.
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Nesse sentido, a realização desta pesquisa visa contribuir para o debate contemporâneo sobre o comportamento social, a partir de uma discussão acerca dos valores e das emoções que cerceiam a rede de trocas e sociabilidade de grupos urbanos considerados desviantes, por não se enquadrarem nos padrões morais considerados normais para a sua aceitabilidade no cenário social.
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Segundo Takeuti (2002), na atualidade, os diversos pontos de vista sociais relativos aos comportamentos juvenis ressaltam determinados fatos, tais como: aumento alarmante das estatísticas de crimes e delitos graves envolvendo jovens de faixas etárias cada vez mais baixas; o interesse preponderante da população juvenil por sexo, drogas, transgressão e violência gratuita; a recusa ao trabalho e à formação educacional; o aumento de gangues juvenis em práticas de vandalismo; a indiferença pelo outro e pela sociedade como um todo, etc.
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Recentemente, temos observado na mídia brasileira, de um modo geral, o acirramento da discussão sobre a juventude, a violência e a redução da maior idade penal, suas possíveis causas e conseqüências, devido aos crimes considerados bárbaros que vêm sendo cometidos por menores (ALVIN & PAIM, 2004). Proliferam pesquisas, debates e estudos sobre o tema, tentando compreender as razões pelas quais esse fenômeno tem se agravado.
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No entanto, em um momento de tensão como a que o Brasil vem enfrentando, devido ao acirramento da violência e da delinqüência juvenil, assim como de toda a discussão que envolve a redução da maior idade penal, faz-se necessário estudos que se voltem não apenas para as características objetivas acerca do jovem delinqüente, mas também, pesquisas que enfoquem as subjetividades desses jovens, principalmente dentro das instituições onde cumprem penas, tendo em vista que estas têm como objetivo a “ressocialização” e “reintegração” dos menores infratores à sociedade.
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Assim, a importância de se fazer este tipo de análise reside na contribuição que se pretende oferecer ao pensamento social nacional acerca da realidade dos grupos em situação de risco e exclusão na atualidade. A especificidade deste trabalho se revela por dar voz aos próprios atores deste cenário, dando realce às suas subjetividades, buscando levantar como se dá à construção de suas identidades sociais, bem como analisar como se configura a pertença no interior de uma categoria de indivíduos representados socialmente como seres desprovidos de valores e referências (KOURY, 2005).
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A investigação debruça-se sobre o cotidiano dos adolescentes infratores internos no CEA – Centro Educacional de Adolescentes, situado na cidade de João Pessoa, uma capital nordestina de pouca visibilidade, menor desenvolvimento e de padrões diferenciados das demais realidades nas quais a maioria das pesquisas sobre a violência e a delinqüência juvenil se debruça, posto que seja vista como uma cidade calma, pacata e provinciana.
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Estas características, porém, não fazem da cidade de João Pessoa um ambiente social alheio às influências universais contemporâneas mais amplas, o que leva, paulatinamente, ao crescimento da violência, da delinqüência juvenil, da reformulação de valores, de novas formas de reconhecimento identitário, dentre tantos outros processos sociais presentes nas relações cotidianas estabelecidas no universo social a ser estudado.
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É neste sentido que a pesquisa proposta visa colaborar. Propõe-se analisar como os adolescentes infratores internos no CEA constroem e percebem o cenário social no qual estão inseridos, quais as emoções despertadas por suas narrativas acerca de si mesmos e dos demais internos, quais os elementos (materiais e/ou simbólicos) valorizados para a constituição de seus círculos de familiaridade e de estranhamento, sua construção de semelhanças e dessemelhanças, assim como também para a construção dos conflitos.
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NOTAS
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1 - O Estatuto da Criança e do Adolescente prevê dois grupos distintos de medidas sócio-educativas. O grupo das medidas sócio-educativas em meio aberto, não privativas de liberdade (Advertência, Reparação de Danos, Prestação de Serviços à Comunidade e Liberdade Assistida) e o grupo das medidas sócio-educativas privativas de liberdade (Semiliberdade e Internação). As medidas privativas de liberdade são norteadas pelos princípios de brevidade e excepcionalidade consagrados no art. 121 do ECA. São aplicadas especialmente para os casos de ato infracional praticado com violência à pessoa ou grave reiteração de atos infracionais graves.
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BIBLIOGRAFIA
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ALVIN, R. & PAIM (2004). “A criança e o adolescente do banco dos réus”. In Alvin et alli (Re) construções da juventude: cultura e representações contemporâneas. João Pessoa, Editora Universitária – PPGS/UFPB.
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BAUMAN, Zigmunt (2005). Vidas Desperdiçadas. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor.
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BECKER, Howard (1977). “Marginais e desviantes”. In: Uma Teoria da Ação Coletiva. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor.
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BENJAMIN, Walter (1986). Walter Benjamin. São Paulo: Ática.
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BOURDIEU, Pierre (1989). O poder simbólico, Lisboa: Difel.
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CARDOSO, Ruth (1997). A aventura antropológica – teoria e pesquisa. Rio de Janeiro: Paz e Terra.
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ELIAS, Norbert & SCOTSON, Johnl (2000). Os estabelecidos e os outsiders. Sociologia das relações de poder a partir de uma pequena comunidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor.
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FOUCAULT, Michel (1999). Vigiar e Punir. Petrópolis: Vozes.
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FREITAS, Rilda Bezerra de (2003). Códigos de Honra: o cotidiano dos jovens internos no São Miguel. Dissertação de mestrado, Fortaleza. Universidade Federal do Ceará. Programa de Pós-Graduação em Sociologia.
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GOFFMAN, Erving (1989). A Representação do Eu na Vida Cotidiana. Petrópolis: Vozes.
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__________ (1999). Manicômios, prisões e conventos. São Paulo: Perspectiva.
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MAGNANI, José Guilherme Cantor (2002). “De perto e de dentro: Notas para uma etnografia urbana.” Revista Brasileira de Ciências Sociais, Vol.17, n. 49.
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MENEZES, Marluci (2000). "Do espaço ao lugar. Do lugar às remodelações sócio-espaciais". Horizontes Antropológicos, a. 6, n. 13.
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NUNES, B.; WELLER, W. (2003). A juventude no contexto social contemporâneo. Estudo de Sociologia. Revista do Programa de Pós-graduação em Sociologia da UFPE. Recife v. 9, n. 2, Recife: Ed. Universitária da UFPE, p. 43-57.
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SANTOS, Boaventura de Sousa, (2006). A gramática do tempo:para uma nova cultura política. São Paulo: Cortez.
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SARTI, Cynthia Andersen (1994). “Ambivalência entre iguais: uma discussão sobre a moral dos pobres”. Trabalho apresentado no XVIII Encontro Anual da Anpocs. Caxambu.
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SOUSA, Cleonia Maria Mendes de (1997). A política de atendimento aos adolescentes tidos como “autores de atos infracionais” em João Pessoa – uma análise da questão. Dissertação de mestrado, João Pessoa. Universidade Federal da Paraíba. Programa de Pós-Graduação em Sociologia.
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_________ (2006). Por onde andam as festas?Um estudo sobre a (re) organização social dos moradores de Cruz das Armas, João Pessoa – PB. Dissertação de mestrado, Recife. Universidade Federal de Pernambuco. Programa de Pós Graduação em Sociologia.
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TAKEUTI, N. M. (2002). No outro lado do espelho: a fratura social e as pulsões juvenis. Rio de Janeiro: Relume Dumará.
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WACQUANT, Loic (1997) The Zone. In: Cultura e Subjetividade: saberes nômades, Daniel Lins (org.), Campinas, São Paulo: Papirus.
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ZALUAR, Alba (1980). Desvendando máscaras sociais. 2ed. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves Editora S. A.
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segunda-feira, 15 de junho de 2009

Série Pesquisas em Desenvolvimento, n. 02 - Junho de 2009

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Publica-se, hoje, neste Blog, o segundo número da Série Pesquisas em Desenvolvimento. Esta Série tem por objetivo a publicação e a divulgação dos Resumos Expandidos das Pesquisas em Desenvolvimento pelo corpo de pesquisadores do GREM, neste ano de 2009.
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Nesta Série, que teve o seu número 01 publicado em 12 de junho de 2009, serão postados resumos individuais dos pesquisadores com um informe sobre suas pesquisas e uma pequena bibliografia referencial de apoio. Será informada, também, a linha de pesquisa do GREM a que estão vinculadas.
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O número 02 da Série Pesquisas em Desenvolvimento publica o Resumo Expandido da pesquisa do pesquisador Alexandre Paz Almeida. A pesquisa em desenvolvimento de Alexandre Almeida tem como objetivo a obtenção do título de Doutor em Sociologia pelo Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal de Pernambuco.
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A pesquisa de Alexandre Almeida está vinculada a Linha de Pesquisa do GREM: Medos Urbanos, Violência, Ruínas e a Construção das Cidades.
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Vamos, então, para o segundo número da Série Pesquisas em Desenvolvimento.
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Título da Pesquisa: As Praças Aristides Lobo e Pedro Américo: espaço de cultura, sociabilidade e contradições no centro de João Pessoa, Paraíba, Brasil
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Pesquisador: Alexandre Paz Almeida
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Resumo: Este trabalho intitulado As Praças Aristides Lobo e Pedro Américo: espaço de cultura, sociabilidade e contradições no centro de João Pessoa, capital do estado da Paraíba, Brasil, faz parte de um projeto de pesquisa de doutoramento que venho desenvolvendo na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e na Universidade Federal da Paraíba (UFPB), vinculado ao Grupo de Pesquisa em Antropologia e Sociologia das Emoções (GREM) da UFPB, coordenado pelo professor Mauro Guilherme Pinheiro Koury.
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No GREM trabalhei na pesquisa sobre Medos Corriqueiros e Sociabilidade Urbana, coordenada pelo Prof. Mauro Koury, o que resultou em uma monografia de final de curso em Ciências Sociais, na Universidade Federal da Paraíba, defendida no ano de 2005, tendo o referido coordenador como orientador. Ao dar continuidade a pesquisa sobre Medos Urbanos, pude também desenvolver uma pesquisa sobre Cotidiano e Sociabilidade em um bairro popular de João Pessoa, resultando em uma dissertação de mestrado, defendida em fevereiro de 2008, na Universidade Federal da Paraíba, intitulada de A Cidade, O Bairro e a Rua: um estudo sobre cotidiano e sociabilidade em Valentina de Figueiredo, João Pessoa, Paraíba.
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Ao compreender os processos de sociabilidade e cotidiano no meio urbano, pude perceber como a lógica do espaço se faz presente enquanto modeladora da vida de grupos e indivíduos que compartilham experiências comuns ou não. O espaço, desse modo, figura como o lócus de trocas de experiências, posição e imposição social, refletindo os anseios e ações dos indivíduos que nele estão imersos, seja através de relações pessoalizadas ou impessoalizadas, o que se torna, de certa forma, um campo onde podemos compreender os significados emocionais e simbólicos, culturalmente construídos no cotidiano e nas formas de sociabilidade, que Simmel (2006) define como lúdicas e contraditórias.
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O Espaço Como Categoria Sociológica
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Pensar um espaço urbano como categoria sócio-antropológica, é também buscar compreender um ambiente em que os diversos atores sociais projetam possibilidades, afirmam identidades, vivenciam ambigüidades, tensões e vários fatores que Simmel (1979) definiu como sendo unicamente metropolitano e moderno. Assim seria a vida nas cidades modernas: contraditória, entediada, carregada de tensões entre o espaço habitado e a vivência dos sujeitos enquanto construtores deste espaço, que se em alguns momentos traz algo de lúdico, por outro lado, faz do conflito algo determinante na formação de um sujeito e de uma identidade moderna, ou como Louis Wirth (1979) prefere, constrói “híbridos biológicos e culturais(1).” Desse modo, a cidade se apresenta com seus aspectos que propiciam a diversidade e diferença cultural, econômica e social, firmados sobre conceitos que delimitam e distinguem categorias que podem ser analisadas sob um universo empírico e suscetível de análise teórica.
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Neste sentido, é basicamente sobre o conceito de heterogeneidade que a sociologia vem se firmar como disciplina que busca uma compreensão do meio urbano e suas nuanças. Os espaços da cidade, desse modo, são compreendidos através da diferença e das reproduções que os atores sociais vivenciam e comungam experiências de redes associativas, de conflitos e experiências de vida emergentes de relações sociais, presentes como forma de integração ou desintegrarão dos grupos relacionais dentro de uma cotidianidade bastante definida. Cotidianidade esta que estrutura a permanência ou não dos indivíduos dentro de redes associativas, bem como os identifica dentro de práticas de compartilhamento, sociabilidades e interações, definidas geograficamente e temporalmente.
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Entre outros aspectos da cidade moderna e ainda observando a idéia de heterogeneidade cultural, também podemos perceber que este ambiente conflituoso e instável, constrói um lócus onde os indivíduos, imersos em relações impessoais e anônimos, são compelidos a uma permanente luta por reconhecimento e por afirmação identitária. Esse ambiente da cidade moderna surgiu por volta da metade do século XIX, através de um capitalismo industrial que vai segregar o caráter idílico das relações sociais, quebrando radicalmente com todas as formas de sujeição feudal, substituindo antigos agrupamentos por formas dispersas, exacerbando contradições sob um intensificado processo de alienação e racionalização das relações sociais, dos atores individuais e dos espaços compartilhados (LEFEBVRE, 2004).
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É bom deixar claro que o conceito de espaço (2) possui uma ampla ressonância, sendo freqüentemente usada na sociológica como significação de um lugar habitado. Portanto, o lugar também pode ser considerado um espaço habitado. O espaço, como categoria sociológica, somente ganha significado quando os homens conseguem habitar ou, simplesmente, demarcar aquele local para suas atividades relacionais ou não. Diferente de espaço e lugar, o conceito de habitar, provém de uma idéia de residir, morar. Todavia, o espaço e o lugar só existem quando se habita. Nessa perspectiva, Augé (1994) vai definir o não-lugar como o um espaço que, diferente do lugar – que é mais relacional, compartilhado e identificado, fazendo histórias e memórias – é totalmente desconexo enquanto projeto de reconhecimento e história social. Segundo Augé, a supermodernidade funda não-lugares, ou seja, espaços sociais que, apesar de serem públicos, quebram com a idéia de compartilhamento. Hotéis, supermercados, aeroportos e estações de metrô, entre outros lugares, são considerados por Augé como não-lugares.
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Percebe-se que o espaço (principalmente os citadinos) significa e ressignifica através das conseqüências e mudanças sociais e individuais, que rapidamente ocorrem em um tempo que parece está cada vez mais submetido ao cotidiano moderno (BAUMAN, 2004; LEFEBVRE, 1998) predominando o sentido de ser e estar, localizado no agora (ELIAS, 1994; KOURY, 2003), em outras palavras, a idéia de viver e se projetar apenas em um tempo-espaço presente parece se fortificar cada vez mais.
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Não obstante, o sentido ou a finalidade de uma praça transcende referências sócio-espaciais e históricas, sendo contextualizada dentro de suas especificidades enquanto projeto arquitetônico desenvolvido, supostamente, com a emergência da polis que diferencia radicalmente da estrutura “feudal”. As praças, bem como ruas, casas, monumentos, entre outras formas de arquitetura da polis, são expressões totalmente distintas dos antigos feudos, que agregavam, esporadicamente, alguns cidadãos em regiões dispersas (SENNETT 2008).
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Diante de tais circunstâncias, está pesquisa pretende compreender a lógica do espaço urbano – através de uma perspectiva sociológica contemporânea e urbana – que racionalmente se modifica, estruturando novos caminhos e possibilidades para se pensar o sentido de cidade enquanto modeladora da vida social e cultural. Neste sentido, a pesquisa se debruça em duas praças do centro da cidade de João Pessoa, capital da Paraíba, buscando, através dos atores sociais que nela estão presentes e se fazem presentes, compreender a lógica do espaço como transformadora das práticas sociais e culturais no meio urbano contemporâneo.
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Primeiras observações e considerações sobre as Praças Aristides Lobo e Pedro Américo
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Bachelard (1985, p.56) afirmou que “somente na vida social e no intercambio das paixões os homens podem viver os conflitos e contradições de seu destino”, no entanto, a paisagem seria um panorama natural que complementaria as vicissitudes de um mundo desfigurado por devaneios da imaginação humana. A paisagem, como espaço elementar para concretude da vida moderna, seria esboçada em imagens que complementariam a imaginação e a concretização do lugar, que por mais que se modifique, estaria eternamente presente na imagem gravada, compartilhada e vivenciada (KOURY 1998). Paisagem, imagem e memória se integrariam sob a dinâmica do espaço presente e ausente (3).
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Presente enquanto real, ausente enquanto imagem e memória, eis a lógica do espaço que se torna concreto, imaginado, histórico ou nostálgico, pois, quem nunca contemplou a imagem de uma paisagem, urbana ou não, em uma fotografia ou apenas no olhar, e não se sentiu extremamente cativado por aquele local? A paisagem, assim como Santos (2008 p. 67) vai definir, figura tudo aquilo que: “nós vemos, que nossa visão alcança, é a paisagem. Está pode ser definida como o domínio do visível, aquilo que a vista abarca. É formada não apenas de volumes, mas também de corres, movimentos, odores, sons etc”.
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As praças Aristides Lobo e Pedro Américo fazem parte desta paisagem da cidade de João Pessoa, onde suas corres, seus sons, sua imagem e todos os tipos de percepções subtraídos por nossos sentidos, fazem das praças um espaço que se concretiza com o movimento intenso dos diversos indivíduos que, anônimos, conhecidos, desconhecidos, com práticas diárias, transeuntes, etc. complementam nossa percepção do lugar, do espaço e da paisagem urbana contemporânea.
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Situadas no centro da capital, serviu e serve de palco para muitas manifestações artísticas e culturais da cidade. Espaço público de entretenimento, lazer e comércio, as duas praças são separadas apenas pelo Comando da Polícia Militar do Estado da Paraíba, este, construído por volta dos anos de 1864, foi projetado, primeiramente como teatro, todavia foi destinado para funcionar como sede do Thesouro Provincial e posteriormente transformado em Secretaria da Agricultura (nome que se encontra na parte externa do prédio, sentido Praça Aristides Lobo) e por fim, Comando da Polícia Militar. O prédio é tombado pelo IPHAEP – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico da Paraíba. O Theatro Santa Roza, localizado na Praça Pedro Américo, é considerado marco da arquitetura moderna do século XIX e ponto de referência turística e de manifestações culturais da cidade de João Pessoa.
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A importância de estudar duas praças centrais da cidade de João Pessoa, não se dá apenas por suas nuanças enquanto espaço configuracional de organização social e territorial da cidade e seus aspectos modernos de compartilhamento e preservação do espaço público (neste ultimo caso, é bom salientar que alguns cientistas sociais compreendem que a atual fase da modernidade tende a fragmentar não só a idéia de espaço público, mas a própria relação social parece esta fadada a impessoalidade e o anonimato dos sujeitos, por conseqüência de uma forte individualização e racionalização propagada pelo cotidiano moderno [4]), mas também saber como os atores sociais compartilham e vivenciam um local que, se de um lado apresenta o pitoresco, por outro lado funda contradições e dramaticidades nas relações arquitetadas cotidianamente.
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As praças Aristides Lobo e Pedro Américo, de certa forma, se enquadram na configuração pitoresca de uma cidade interiorana. Seu ambiente interno não possui quadras de esportes ou parques infantis, mas grandes arvores e vários bancos que a circundam. Com um comércio diversificado, que vai desde a venda de artesanatos, a floriculturas artificiais, passando pela informalidade dos fotógrafos “lambe-lambe” (5) e das prostitutas que marcam seu espaço de trabalho diariamente a partir das cinco horas da tarde, as praças são também circuladas por um amplo comércio de lojas de eletrodomésticos e roupas (6). Situadas em um ponto estratégico do centro de João Pessoa, o seu acesso se dá por várias avenidas principais, sendo a Guedes Pereira, passando pelo viaduto Damásio Franco, os mais comuns, o que torna os seus arredores bastante movimentados pelo fluxo constante de ônibus e carros.
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A presença de transeuntes, consumidores, trabalhadores do comércio, policiais militares, assim como religiosos que ocupam seu espaço para pregações e evangelização, como os grupos de idosos que sentam nos bancos ao entardecer, também são figuras sociais presentes no interior das praças, são atores localizados em um tempo e espaço específico, marcados por um cotidiano moderno que, por ser imperceptível, (LEFEBVRE 1998; BAUMAN 2004, 2005; HELLLER 1998) dificilmente torna possível a percepção das rápidas mudanças e transformações sociais, ambientais e culturais.
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As praças aqui estudadas se tornam um amplo espaço de sociabilidade, de reconhecimento, de trabalho, de lazer e - mesmo mantendo peculiaridades do espaço público habitado e planejado: bem localizado, arborizado, de fácil acesso - as tensões e contradições podem ser percebidas nas minúcias do cotidiano imperceptíveis aos olhos dos vários atores sociais que nela se fazem presente. Neste sentido, o espaço público para lazer ou comercio, para reconhecimento daqueles usuários habituais ou transeuntes, também é palco de contestação ao poder público por melhores condições de trabalho ou lazer (FRÚGOLI JR, 2000), de incômodo e reclamação com as prostitutas que trabalham lá, de se sentirem desprezados por não serem mais reconhecidos profissionalmente, como é o caso dos lambe-lambes.
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As praças Aristides Lobo e Pedro Américo, dessa forma, se tornam palco de investigação desta pesquisa, onde, através de seus tipos sociais, se buscará entender a lógica do espaço público-relacional; as configurações e reconfigurações sociais e históricas, culturais e simbólicas do local como elemento norteador de sociabilidade e identidade (DaMATTA, 1987; KOURY, 2003; MENEZES, 2000) .
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Conclusão
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É nas formas de apropriação destes dois espaços urbanos, do centro da cidade de João Pessoa, que se procurará analisar as referências identitárias construídas pelos diferentes sujeitos, bem como de que maneira as intervenções modernizadoras no espaço modificam e redefinem identidades, estruturam redes de sociabilidade, definindo uma cultura, se assim podemos chamar, diversificada e diferenciada, ou seja, heterogenia.
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Nesta perspectiva, para se compreender as tramas de sociabilidade no meio urbano, é fundamental se perceber a organização do espaço, com seus lugares e fenômenos de deslocalização (7), (MENEZES, 2000), bem como as diversas representações sociais que são moldadas dentro de um espaço usual, ou seja, compartilhado e vivenciado por grupos e indivíduos singulares, mas interdependentes enquanto construtores de um ambiente comum e reconhecido (ELIAS, 1994), o que segundo Koury (2005), vai estabelecer formas de apropriação de um espaço, que além de gerar núcleos de construção simbólica sobre o lugar, também fomentará um sentimento de pertencimento e uma atribuição de significado ao lugar, refletindo-se na significação dos próprios atores sociais que habitam a cidade. Atores que compartilham situações semelhantes, que vivenciam experiências em um tempo-espaço presente no cotidiano, formando imagens mentais e históricas comuns aquele social e grupo específico (DaMATTA, 1987). Por fim, para se entender a problemática entre indivíduos e espaço, deve-se buscar uma idéia de conjunção entre as vidas que habitam e pensam, que se relacionam e constroem o espaço enquanto elemento referencial de uma identidade grupal e individual.
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Notas
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[1] Para Wirth, assim como Simmel, a cidade moderna e industrial é um campo de complexidade humana, onde se agrupa um grande número de indivíduos heterogêneos, que compartilham um tipo de cultura, caracterizado por papeis sociais superficiais e relações fragmentadas.
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2 Na filosofia de Kant, o espaço, assim como o tempo, faz parte de uma estética transcendental, ou seja, é perceptível ao nosso espírito, mas independe de nossa realidade concreta para existir. Em Kant, ainda percebemos como o espaço e o tempo são categorias fundamentais para compreensão de nossa existência física, metafísica e material.
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3 SANTOS (2008. p. 67 e 68) denominará a paisagem como o conjunto das coisas que se dão diretamente aos nossos sentidos, onde o espaço, (que é sujeito a diversas transformações e configurações) resultará de um casamento entre o território, a paisagem e a sociedade. Ver SANTOS, Milton. Metamorfoses do Espaço Habitado.
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4 Sobre este assunto ver os trabalhos de (BAUMAN, 2004; 2005) (LEFEBVRE, 1998; 2004) (KOURY, 2003ª) (SENNETT, 1998) e (HARVEY, 1993).
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5 É bom ressaltar que os fotógrafos lambe-lambe estão neste local e nesta profissão há mais de trinta anos, tentando, ainda, mesmo sem utilizar as antigas técnicas de fotografar e revelar, sobreviver pela uma forte tradição que os insere dentro um espaço-tempo que sobrevive pelo simples fato de preservação de uma identidade e memória coletiva e individual.
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6 Na Atenas de Péricles, por volta de 430 a.C. as praças eram os espaços mais freqüentados pelos cidadãos atenienses, nelas pessoas ricas ou pobres caminhavam livremente, entretanto, eventos cerimoniais e políticos não poderiam ser contemplados por escravos e estrangeiros (SENNETTE 2008). Sennett (2008) também nos mostra que, na antiga Atenas, somente poucos cidadãos tinha o privilégio de se expressar no interior das praças, onde apenas homens de letras mantinham o domínio do discurso político, todavia atividades de comércio e lazer faziam parte do cotidiano das ágoras naquele período.
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7 Segundo Menezes, o ato de deslocar pode ser simbólico, ou seja, signos e significados representados e construídos pelos diversos atores, como também representa uma mudança ou invenção de um lugar.
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Bibliografia
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sexta-feira, 12 de junho de 2009

Série Pesquisas em Desenvolvimento, n. 01 - Junho de 2009

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A partir de hoje o Blog inicia uma nova Série intitulada Pesquisas em Desenvolvimento, com a publicação de Resumos Expandidos das Pesquisas em Desenvolvimento pelo corpo de pesquisadores do GREM, neste ano de 2009.
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Nesta nova Série, serão postados resumos individuais dos pesquisadores com um informe sobre suas pesquisas e uma pequena bibliografia referencial de apoio. Será informada, também, a linha de pesquisa do GREM a que estão vinculadas.
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Esta Série Pesquisas em Desenvolvimento tem início com a publicação do Resumo Expandido da pesquisa da pesquisadora Anne Gabriele Lima Sousa. A pesquisa em desenvolvimento de Anne Gabriele tem como objetivo a obtenção do título de Doutor em Sociologia pelo Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal de Pernambuco.
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Vamos, então, para o primeiro número da Série Pesquisas em Desenvolvimento.
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A linha de pesquisa do GREM que a pesquisa em desenvolvimento de Anne Gabriele está alocada é a Estudos em Sofrimento Social e Sociabilidade.
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Título da Pesquisa: Valores, emoções e construção de identidades de moradores das ruas de João Pessoa, Paraíba, Brasil
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Pesquisador: Anne Gabriele Lima Sousa
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Resumo: Esta pesquisa busca compreender os processos simbólicos que permeiam a construção dos vínculos sociais e a elaboração das referências emocionais que dão sentido a uma subcultura da vida de rua, a partir das respostas adaptativas e das estratégias de sobrevivência que permeiam as redes de sociabilidade dos indivíduos adultos em situação de rua, inerentes ao cenário urbano da cidade de João Pessoa, capital do estado da Paraíba.
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Busca-se, sobretudo, apreender as relações intersubjetivas dos indivíduos em situação de rua em sua vida cotidiana nos espaços físicos (com valor funcional) e simbólicos (com valor afetivo), a partir do modo como constroem suas memórias afetivas e, a partir delas, se localizam, se posicionam, percebem o mundo social e interagem com ele.
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A pesquisa está em desenvolvimento e objetiva a composição da minha tese de doutorado em sociologia, com defesa prevista para fevereiro de 2011.
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A apreensão dos processos simbólicos que permeiam as formações societárias entre os indivíduos em situação de rua de João Pessoa busca suporte analítico nas reflexões despertadas pela Sociologia das Emoções (KOURY, 2001, 2003 e 2005), pela Sociologia do Reconhecimento (SOUZA, 2003 e 2006; TAYLOR, 1995 e 1997a), pela Sociologia da Vida Cotidiana (GOFFMAN, 1988 e 1989; MARTINS, 2000 e 2003) e pela Sociologia da Cultura (BOURDIEU, 1992, 2001 e 2007), promovendo o debate teórico-metodológico entre áreas de concentração distintas, mas que interligam-se na análise do comportamento social contemporâneo.
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A compreensão da dinâmica encenada pelos atores da pesquisa vem sendo realizada através de um esforço etnográfico, de descrição e interpretação das práticas e das rotinas que permeiam as relações inerentes ao campo, permitindo um conhecimento mais detalhado sobre ele.
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O contato inicial com os atores da pesquisa se deu por intermédio das ONG’s e dos demais órgãos que desenvolvem algum tipo de atividade com esta população. O acompanhamento das atividades das organizações, com o intuito de observar e me fazer ser percebida e reconhecida, visou, principalmente, minimizar o estranhamento da população em relação à figura de pesquisadora estrangeira ao grupo, para a construção de uma relação de confiança recíproca, favorecendo a natureza do processo interativo, necessário para o desenvolvimento das demais etapas da pesquisa.
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Identificados os informantes-chaves para o aprofundamento das questões relevantes para a pesquisa, o momento seguinte foi o de dissociar a minha posição de pesquisadora com a imagem institucional do órgão que intermediou a primeira aproximação com os atores. Esse esforço foi necessário, para que pudesse, uma vez já estabelecido o contato, construir relações mais estreitas com os informantes, para que me fosse permitido acesso ao conjunto de experiências e de significados que dão sentido às trocas interacionais, ambíguas e contraditórias, provindas do multipertencimento nas distintas situações de inserção, nas redes de sociabilidade em que eles fazem partem.
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A partir desses informantes-chaves, a seleção dos demais informantes têm sido do tipo bola de neve, onde o diálogo com determinado informante revela personagens significativos para a compreensão do fenômeno social investigado. Tem-se, no entanto, buscado abarcar indivíduos com características diferenciadas, de modo a oferecer um amplo conjunto de interpretações sobre o mundo social do qual fazem parte, bem como a identificar os diferentes tipos que compõem esta população, no que tange aos seus padrões de inserção e estilo de vida adotado na rua.
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As entrevistas orais têm sido realizadas em profundidade, através de encontros sucessivos com o mesmo informante, no intuito de captar os distintos elementos inerentes às suas trajetórias sociais, culturais e emocionais, bem como perceber ênfases e contradições nas suas narrativas.
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Apreender as emoções expressas nas narrativas implica compreender a relação que os indivíduos estabelecem com o mundo social que eles tecem e que adquire sentido para eles, na elaboração das memórias afetivas de suas experiências urbanas.
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Servindo-se da memória como ferramenta de elaboração das lembranças e de localização e inscrição do sujeito em um contexto sociocultural específico, a pesquisa tem buscado levantar como se dá a construção de suas identidades sociais e de suas redes de sociabilidade, bem como analisar como se configura os processos de enraizamento e pertença entre os diferentes grupos de indivíduos que compõem a população em situação de rua.
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Os indivíduos urbanos em situação de rua, população situada no nível mais baixo da estrutura de classes, estão localizados em uma posição de estigmatização (GOFFMAN, 1988) e extrema exclusão, por adquirirem visibilidade a partir da não participação legítima, arbitrária ou inevitável, das convenções sociais reclamadas para a aceitabilidade e reconhecimento no cenário social urbano contemporâneo, tais como casa (em uma concepção que a compreende enquanto espaço privado e endereço fixo), trabalho (ocupação formal e fixa) e família (dentro do modelo tradicional de estrutura familiar), entre outros. Além disso, a materialidade através da qual o corpo dos indivíduos em situação de rua é percebido, ao contrariar os padrões socialmente instituídos de etiqueta corporal, justificam a impossibilidade de integração desses indivíduos ao cenário urbano de forma assentida.
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A dissociação desses modelos classifica esses indivíduos como não-adequados à vida pública urbana, por situarem-lhes como o contrário, ou o negativo, dos tipos aceitáveis de indivíduos.
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Segundo Martins (2000), estranhos e prejudiciais ao espaço, sobretudo à sua imagem, os trajetos desses indivíduos causam desconforto e embaraço aos demais habitantes urbanos, onde o seu afastamento assume os traços de medo de contágio.
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Isto se dá porque, no imaginário social predominante na atualidade, a pobreza econômica é vista como solo da desagregação moral e, neste sentido, a condição de pobreza extrema é sempre passível de se converter em marginalização (Telles, 1990). O indivíduo em situação de rua, nesta direção, é reduzido à condição de coisa descartável (MARTINS, 2003), percebido por grande parte da sociedade a partir de classificações pejorativas, como marginais, vagabundos, bêbados, loucos, ladrões, entre outras representações, que refletem a ótica hierarquizada e o princípio de repugnância a partir do qual são qualificados (SERRANO, 2004).
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Além da postura de desprezo, outra postura assumida pelas outras parcelas da população urbana, é responsável pela reafirmação da inferioridade dos indivíduos em situação de rua. Trata-se, das expressões de compaixão, que demarcam o lugar do outro, subalterno, digno de piedade e caridade, distanciando-o da posição de igualdade (COELHO, 2003).
Para Snow e Anderson (1998), se, de um lado, esses indivíduos são objeto de medo e desprezo, pois se considera que eles ameaçam o bom funcionamento social, por outro lado, são dignos de compaixão, pois se acredita que eles consistam em vítimas das forças sociais e do azar. Há, em ambos os casos, o reconhecimento da sua subalternidade frente aos demais.
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A pesquisa tem buscado dar voz aos protagonistas dessas relações, dando realce às suas subjetividades e à construção de significados acerca de si mesmos e dos demais indivíduos, em meio aos processos interativos aos quais são submetidos em sua vida cotidiana nos espaços públicos citadinos, bem como às emoções despertadas por tais vivências, analisando os elementos e práticas sociais que mediam a instituição de uma subcultura da vida de rua.
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As trajetórias sociais heterogêneas reveladas na coleta de dados têm descortinado diferentes mecanismos de inserção, estratégias de sobrevivência e formas de sociabilidade, fundando estilos de vida distintos entre os indivíduos em situação de rua, atores desta pesquisa.
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Apesar da incompletude do trabalho de campo não permitir considerações definitivas sobre os resultados pesquisa, algumas características podem ser elucidadas, a fim de esboçar algumas questões que cerceiam o cotidiano da vida de rua na cidade de João Pessoa.
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A intensa mobilidade sócio-espacial faz com que o nomadismo figure como uma das características mais comuns da vida de rua. Diante da supervalorização do trabalho formal como única possibilidade de inserção e reconhecimento do indivíduo pobre em certas estruturas sociais contemporâneas, a migração por entre cidades, estados e países apresenta-se como uma densa prática exercida por indivíduos situados em classes menos favorecidas economicamente, oriundos, principalmente, de áreas geográficas precárias, que se dirigem aos centros urbanos na procura por alternativas de sobrevivência material.
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Para Martins (2000), os processos migratórios vivenciados por indivíduos que já preliminarmente suprimiram seus valores sociais de referência em prol da busca por oportunidades de trabalho, são intensificados pelo não-reconhecimento de um espaço como um lugar de familiaridade, de formação de vínculos, levando o indivíduo a deslocar-se incessantemente por diferentes regiões físicas e morais. Esse desenraizamento revela a ausência de integração do indivíduo com as redes de sociabilidade do meio em que habita, levando-o a migrar em busca de um espaço de participação e de reconhecimento, que lhe ofereça a sensação de pertencimento.
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O contexto de instabilidade socioespacial encenado por grande parte da população de indivíduos em situação de rua nos centros urbanos produz um jogo de reflexos, onde os movimentos migratórios na busca pela sobrevivência material dificultam o estabelecimento de vínculos fortes e de relações duradouras, ao mesmo tempo em que a impermanência dos vínculos e o enfraquecimento das redes próximas de proteção amplia a sua propensão aos deslocamentos territoriais.
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Apesar da maior parte da população em situação de rua de João Pessoa ser proveniente do próprio estado, e de muitos, inclusive, possuírem parentes na própria cidade, quase a totalidade dos informantes abordados pela pesquisa até o momento, já migraram para outros estados em busca de trabalho ou da construção de vínculos que lhes oferecessem conforto emocional, em meio às conjunturas protagonizadas pelos mesmos ao longo de suas vidas.
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A pertença, segundo Koury (2001) é o fundamento da percepção dos sujeitos da sua auto-imagem e do seu lugar no mundo. Entre os entrevistados, principalmente entre os idosos, o retorno à cidade de origem representa a busca por reencontrar suas raízes, diante do sentimento de pertença com o local. Mesmo diante das rupturas originais que levaram aos deslocamentos, a impossibilidade da construção de vínculos suficientemente sólidos com os locais por onde migraram, favorecem o retorno às origens como modo de buscar um lugar de familiaridade, a partir do qual podem reconhecer a si mesmos.
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No que tange às causas que levam ao desabrigo, estes não têm origem exclusivamente estruturais, nem tampouco individuais, mas residem na interação entre esses dois elementos, assumindo uma forma espiral, onde um fator deflagra o outro, simultaneamente.
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No caso desta pesquisa, a erosão de uma rede de apoio familiar solidária tem se apresentado como o principal fator de ingresso dos indivíduos nas ruas. Na sociedade contemporânea, onde a família é percebida como suporte material e afetivo dos indivíduos, amortecedor institucional entre as estruturas sociais do mundo mais amplo e suas estruturas psíquicas, e principal instituição formadora de seus valores, atitudes e padrões de conduta (GOLDANI, 2002), a deficiência das bases relacionadas a essa estrutura pode levar a uma desorganização das estruturas emocionais dos indivíduos. Quando os indivíduos não conseguem suportar as adversidades, ou não encontram no plano familiar amparo para as suas dificuldades, o ingresso na rua muitas vezes se revela como fuga, ou mesmo como única alternativa à crise instaurada.
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Associado à falta de uma base familiar sólida, o álcool figura, não apenas como um dos principais personagens da composição de uma subcultura da vida de rua, mas como um dos principais fatores de fragmentação familiar e causa de ingresso nas ruas. As experiências narradas pela maior parte dos informantes têm revelado o alcoolismo, mais como princípio motor determinante da situação de rua, do que apenas uma via de fuga alternativa das adversidades em que são sujeitados em seus contatos intramundanos.
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A memória social constituída pelas experiências dos indivíduos em situação de rua, em meio às constantes reorganizações socioespaciais que a vida nas ruas os submetem, tem se revelado pelas narrativas como permeada de um contínuo processo de ressignificações, onde passado, presente e futuro adquirem sinais de descontinuidade. Os relatos revelam uma instabilidade na forma como o passado é reconstruído, ora a partir de embelezamentos favoráveis, ora ressaltando intensas dores e desilusões.
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É comum, entre os indivíduos recém-imersos na rua, a negação em relação à sua condição de desabrigo, como uma tentativa de fuga das relações de hostilidade em que se vêem sujeitos e, sobretudo, como modo de reafirmar o seu valor como ser humano, lesado pelos lembretes de sua extrema inferioridade, reproduzidos nas circunstâncias corriqueiras.
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No entanto, à medida que o tempo na rua vai cristalizando a vivência em seu interior, os indivíduos passam a se familiarizar com as circunstâncias que a permeia, passando a atribuir sentidos a si mesmos e reivindicando suas identidades sociais no interior da conjuntura em que se encontram (Snow e Anderson, 1998).
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O reconhecimento de si mesmo como pertencente ao espaço da rua carrega consigo toda a carga internalizada que concebe a rua como espaço de desorganização, destituída de qualquer moralidade, evidenciando com isso um acordo de subalternidade do indivíduo em relação ao seu valor próprio e ao significado da sua existência na rua (TAYLOR, 1997a).
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Nesta direção, as narrativas dos atores da pesquisa acerca das circunstâncias cotidianas experienciadas por eles têm revelado um consenso incutido socioculturalmente no modo como olham para si e se colocam no mundo, através de um auto-reconhecimento do seu estado de inferioridade frente aos demais, a partir da interiorização dos mesmos critérios utilizados pela autoridade externa para classificá-los como inferiores. Assim, os indivíduos em situação de rua se comportam e percebem as situações a partir da concordância de que valem menos que os demais indivíduos, têm menos direitos e são menos dignos de respeito (SOUZA, 2003 e 2006).
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Há, desta forma, uma naturalização da desigualdade, compondo regras de convivência em seu interior, onde a diferença e a necessidade passam a ser encaradas como habituais, condição dada pela natureza e assumida como um fado do qual não se pode fugir (BOURDIEU, 2001 e 2007).
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As questões explanadas nas linhas precedentes, entre outras relações identificadas no campo até o momento, não devem ser tomadas como definitivas, pois, uma vez que a pesquisa empírica está em andamento, outros elementos podem ser identificados, alterando também as percepções sobre o objeto estudado e os rumos da análise.
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Além disso, a diversidade de contextos revelados nas histórias de vida e nas experiências cotidianas dos entrevistados faz com que a posição dos indivíduos frente aos elementos identificados assuma contornos distintos, diferenciando-os e configurando tipos específicos de moradores de rua.
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Neste sentido, as posições dos indivíduos quanto aos fatores que os levaram para as ruas, o tempo de moradia nas ruas, suas aspirações de sair ou permanecer, suas disposições a enraizamentos ou desenraizamentos territoriais, bem como suas posturas em relação ao álcool ou outras drogas, suas escolhas em relação ao modo de dormir e de adquirir dinheiro e bens materiais, e o modo de perceberem a si mesmos, o mundo social e a se localizarem e interagirem com ele, funda semelhanças e gera distinções entre pautas comportamentais, descortinando tipos identitários distintos, arrolados a estilos peculiares de vida. Traça-se, desta forma, os contornos de uma ordem ilegítima de vida, instituída no interior de um contexto socioespacial no qual seus personagens são rejeitados, mas do qual se vêem pertencentes.
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