Contador de Visitas

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Medos, Sociabilidade e Emoções: breve itinerário profissional de um amigo.

[Uma primeira versão deste itinerário saiu na RBSE – Revista Brasileira de Sociologia da Emoção, v. 7, n. 20, pp. 237 a 343. Agosto de 2008. ISSN 1676-8965. http://www.cchla.ufpb.br/rbse/Index.html]

Acompanho deste muito tempo o trabalho de Mauro Guilherme Pinheiro Koury, desde o tempo em que ele trabalhava com a questão sobre organização dos trabalhadores, rurais e urbanos, com a problemática sindical e a temática do trabalho[1]. Na realidade, o conheci, pessoalmente, na fase de transição, uma das fases, acredito, quando ele estava saindo das áreas de movimentos sociais e de trabalhadores e a do trabalho, e adentrando em duas outras áreas fecundas e, até então, pouco exploradas pelas Ciências Sociais no Brasil: as áreas da imagem e a das emoções.

Na primeira área de transição, aportou entre uma sociologia da imagem e uma antropologia da imagem. E nela realizou trabalhos significativos em prol de uma visão crítica sobre o instrumento fotografia, chegando a ganhar prêmio de melhor trabalho escrito sobre fotografia pela FUNARTE, em 1998, além de ser um dos pesquisadores que possibilitaram a constituição e consolidação da área de imagem no Brasil, nos anos de 1990[2]. Na segunda área de transição, aportou no interior de uma Antropologia e de uma Sociologia das Emoções, também na década de 1990, - ver, nesse sentido, o seu delicioso Introdução à Sociologia da Emoção (João Pessoa, Manufatura, 2004)[3]; entrou como pesquisador nesta área através de suas investigações sobre morte e morrer no Brasil, e principalmente em uma extensa produção de artigos e livros sobre o trabalho de luto - ver, por exemplo, pra mim um clássico na literatura desse gênero e único, acredito, no Brasil, Sociologia da Emoção: o Brasil urbano sob a ótica do luto [Petrópolis, Vozes, 2003], que sintetiza, acredito, todo o seu trabalho neste tema, - sempre em cruzamento com a área de imagem e, especificamente, da imagem fotográfica. Ver, nesse sentido, por exemplo, o seu Amor e Dor [Recife, Edições Bagaço, 2005], ou ainda, Imagens & Ciências Sociais [João Pessoa, Editora Universitária, 1998], aonde conduz a análise da fotografia através do cruzamento com a questão da morte, do morrer e do luto no Brasil e no Ocidente.

Esta transição, que poderia chamar de uma apuração do olhar analítico, não pode, por outro lado, ser chamada de ruptura. Para um olhar atento, em toda a obra de Koury existe uma preocupação insistente, persistente, teimosa, até, com a busca de compreensão do processo de formação do indivíduo no Brasil moderno e contemporâneo, que, em um artigo de 1996 chamou de homem melancólico[4].

Sua excelente e ampla pesquisa discute (e a cada novo livro ou ensaio amplia o debate) as mudanças comportamentais do brasileiro de classe média e traça um perfil do Brasil urbano contemporâneo para o entendimento do processo recente do individualismo que toma conta das relações sociais no país. A cada novo livro discute e vem ampliando a compreensão do processo de transformação vivido pelos brasileiros comuns, principalmente pelos habitantes das capitais brasileiras, nos últimos quarenta anos, mostrando a verticalidade e aceleração das mudanças de hábitos e estilos de comportamento experimentados e a ambivalência e sofrimento social resultante.

É o que ocorre neste novo livro de Koury. A começar pelo título: De que João Pessoa tem medo? Remete o leitor para uma análise do imaginário das relações sociais vividas ou experimentadas pelos moradores da cidade de João Pessoa, capital da Paraíba. Sua preocupação é com o indivíduo e seu comportamento na modernidade conservadora brasileira atual, como vem sendo desde o seu mais anterior trabalho, mas, vincula este indivíduo à sua prática social e as redes de relações que o formam e o informam e que são por ele, também, formadas e informadas. Faz parte de uma pesquisa em andamento, sobre medos corriqueiros, onde busca analisar o Brasil urbano, de 1970 para cá, dentro de uma ótica em que o medo é estruturador, cria liames e permite a construção social. Ver, neste caso, o seu excelente artigo, Medo, vida cotidiana e sociabilidade, publicado, pela primeira vez, em 2002 (Política e Trabalho, n. 18), bem como a etnografia O vínculo ritual (João Pessoa, Editora Universitária, 2006).

O livro analisado é o primeiro de uma série de etnografias urbanas de capitais de estados brasileiros, da pesquisa Medos Corriqueiros. Retrata a estreita relação entre sociabilidade e medo em uma cidade, em um local específico, aqui, João Pessoa, como busca de compreensão do movimento local para o todo brasileiro que a pesquisa em seu totum sinaliza. Como hipótese principal de trabalho parte do pressuposto de que o medo é uma relação social significativa para a compreensão de qualquer formação social. Em toda e qualquer forma de sociabilidade o sentimento de medo parece encontrar-se presente como uma das principais forças organizadoras deste social. Estimulando, de um lado e de forma concomitante, o estranhamento em relação ao outro, o receio de enfrentá-lo e a aventura do encontro, a construção dos segredos que aproximam e conjugam e o sentido de pertença e sua relação com os códigos da confiança e lealdade resultantes. Sempre dentro de uma tensão e de um conflito conjugados e densos que conformam o imaginário da traição e do medo possíveis.

De que João Pessoa tem medo? Procura, assim, discutir, - como o autor informa na introdução, - “o que é medo e do que os habitantes da cidade de João Pessoa sentem medo, e as formas de constituição social do medo no imaginário da cidade”. Insere-se nas práticas cotidianas dos informantes e no seu imaginário sobre a cidade e tem por finalidade debater as formas de sociabilidade e uso do espaço à luz do medo no meio urbano contemporâneo.

No decorrer de sua explanação a cidade aparece como um lugar de fascínio, no seu desenvolvimento e expansão e, ao mesmo tempo, um lugar de estranhamento, de não reconhecimento, de fragmentação do pertencimento. É um livro de maturidade, no conjunto da obra de Koury. Nele o autor discute a relação entre medo e sociabilidade no espaço urbano de uma forma inovadora e prenhe de possibilidades analíticas; seja para aqueles próximos à discussão acadêmica das Ciências Sociais e afins contemporâneas no Brasil e no mundo, ou ainda, para todos aqueles preocupados em compreender a experiência recente por que passa a formação do indivíduo na modernidade brasileira e ocidental atual. É um livro que, a meu ver, deve ser lido e refletido por todos.

Neste caminho investigativo sobre medo corriqueiro e imaginário social no Brasil urbano, Koury ingressou, recentemente, em uma série de artigos sobre o significado de sujeira e do que é considerado sujo pelos habitantes urbanos de seis capitais brasileiras. Algumas análises introdutórias podem ser lidas no Blog do seu grupo de Pesquisa, o GREM http://grem-sociologiaantropologia.blogspot.com/, com artigos para serem publicados em breve nas Revistas Política e Trabalho e Tempo Social.

Neste momento, encontra-se em campo, dando continuidade a terceira fase da pesquisa sobre medos corriqueiros e cidades no Brasil, entrevistando os moradores das 27 capitais dos estados brasileiros. É esperar os resultados de sua análise, a ser lançada até 2012, como conclusão do projeto citado.

Este itinerário, assim, é uma homenagem a um grande profissional das ciências sociais do Brasil, vinda de um amigo e admirador.

Pierre Aderne Chamber [Doutor em Sociologia e Professor do departamento de Développement social et analyse des problèmes sociaux da UQAR - Université du Québec à Rimouski].



[1] Na realidade, soube a pouco que ele retomou questões ligadas ao trabalho e ação sindical. Saiu recentemente um artigo dele sobre greves rurais no Caderno do CRH, n. 56, agosto de 2009.

[2] Ver, por exemplo, entre inúmeros artigos, os livros Usos da Imagem (JP, Manufatura, 1997); Imagens & Ciências Sociais (JP, Editora Universitária, 1998); Imagem e Memória (RJ, Garamond, 2000); Amor e Dor (Recife, Edições Bagaço, 2005) e, no prelo, Relações Delicadas: Ensaios sobre fotografia e sociedade (a ser lançado, em breve, pelo selo da Ed. Universitária - UFPB).

[3] - Que infelizmente, soube a pouco, se encontra esgotado. Este livro merece, creio eu, uma nova edição, se não pela originalidade e ampla visão sobre a área da sociologia das emoções nele existente, por ser o primeiro livro a tratar no Brasil da enorme tarefa de discutir o campo da sociologia da emoção no interior das Ciências Sociais e, especificamente da sociologia geral. Recentemente lançou um outro livro Emoções, Sociedade e Cultura (Curitiba, Editora CRV, 2009), que dá continuidade ao Introdução...

[4] - Koury, Mauro Guilherme Pinheiro. “A Formação do Homem Melancólico: Luto e Sociedade no Brasil”. Cadernos de Ciências Sociais, n. 38. João Pessoa, PPGS/UFPB, 1996.

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Divulgando

II Seminário Imagens & Narrativas
*
10 nov 2009
Teatro Noel Rosa – UERJ

PROGRAMAÇÃO
9h – Abertura
INARRA convida NEXTimagem
Clarice Peixoto (INARRA - PPCIS/UERJ) e Marco Antonio Gonçalves (NEXTimagem – PPGSA/UFRJ).

10h Vídeos e debate com realizadores
Figuras oníricas, 35′, 2008, de Marco Antonio Gonçalves e Els Lagrou (NEXTimagem – PPGSA/UFRJ). O filme trata do escultor e xilogravurista de Juazeiro do Norte (CE), Nilo, e seu imaginário.
Ciclo dos Caixotes, 5′, 2009, de Angela Taddei, Cris Carvalho, Diana Dianovsky, Mariana Leal, Sandra Costa e Thiago Passos (PPCIS/UERJ). As desprezadas caixas de madeira, que movimentam o comércio de legumes e hortaliças, entram em cena para revelar dinâmicas sociais.
Cantinho da Terra, 7′, 2009, de Agustín Sampron, Aline Gama, Cecília Bastos, Camille Gonçalves e Victoria Tomaz (PPCIS/UERJ). Trata de um ponto de encontro e resgate da cultura portuguesa na Zona Norte do Rio de Janeiro.

11h Ensaios Fotográficos e conversa com os pesquisadores
Marés de Imagem, de Thiago Carminati (NEXTimagem – PPGSA/UFRJ).
Apertando um Baseado: retratos visuais de um ritual prosaico, de Andrew Müller Reed (Ciências Sociais/UERJ). O ensaio trata deste ritual corriqueiro bem conhecido dos usuários regulares de maconha.
Ir e Vir, de Bárbara Copque (INARRA - PPCIS/UERJ). Apresenta alguns percursos fotográficos, realizados por oitos meninos em situação de rua, participantes de uma oficina fotográfica.

13h Vídeos e debate com realizadores
Dr. Raiz – Etnovideoclip (Cariri/Lapa), 30′, 2009, de Marco Antonio Gonçalves (NEXTimagem/PPGSA/UFRJ).
Ilha Grande em outros tempos, 40′, 2009, de Clarice Peixoto, pesquisa Myrian S. dos Santos (PPCIS/UERJ). O vídeo evoca histórias marcadas pelo aprisionamento e pela violência que permanecem no imaginário coletivo de moradores da Ilha Grande.
Gisèle Omindarewa, 71′, 2009, de Clarice Peixoto (INARRA, CTE/SR3-UERJ, DaTerra Produtos Culturais). Documentário sobre a vida de uma mãe de santo francesa e o cotidiano do seu terreiro em Santa Cruz da Serra, RJ.

16h30 – Os dois lados da câmera
Conversa com Gisèle Omindarewa, Peter Fry (PPGSA/UFRJ) e Clarice Peixoto (INARRA - PPCIS/UERJ).

Coordenação Geral: Clarice Ehlers Peixoto
Coordenadores: Aline Gama de Almeida e Andrew Müller Reed
Apoio à montagem: Tassia Raquel Gusmão
Apoio: Divisão de Teatros da UERJ / DECULT, SR-3
Realização: INARRA (Imagens, Narrativas, e Práticas Culturais CNPq-UERJ)

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Claude Lévi-Strauss morreu na noite de 31/10/2009

*
L'ethnologue Claude Lévi-Strauss est mort
LE MONDE.FR 03.11.09 • Mis à jour le 03.11.09
*
L'ethnologue et anthropologue Claude Lévi-Strauss est mort dans la nuit du samedi 31 octobre au dimanche 1er novembre à l'âge de 100 ans, selon le service de presse de l'Ecole des hautes études en sciences sociales (EHESS) contacté par Le Monde.fr. Plon, la maison d'édition de l'auteur de Tristes Tropiques, a également confirmé l'information diffusée par Le Parisien.fr en fin d'après-midi. Claude Lévi-Strauss, qui a renouvelé l'étude des phénomènes sociaux et culturels, notamment celle des mythes, aurait eu 101 ans le 28 novembre.
*
**

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Sociologia das Emoções: dica de leitura

*
HOPKINS, Debra R., Jochen Kleres, Helena Flam and Helmut Kuzmics, (eds.). Theorizing Emotions: Sociological Explorations and Applications. Frankfurt am Main, New York: Campus Verlag, 2009.
*
Esta nova coletânea em Sociologia das Emoções: Theorizing Emotions: Sociological Explorations and Applications, organizada por Hopkins et al, reflete sobre a volta recente às emoções na academia. Baseando-se nos estudos clássicos de Max Weber, de Erving Goffman e de Norbert Elias, diversos estudiosos europeus discutem o papel das emoções em várias facetas da sociedade, do laboratório ao escritório e à mídia. Entre os diversos tópicos discutidos se encontram as tensões entre sentimentos e regulações; as emoções conscientes e inconscientes no trabalho científico; as emoções e a desordem social; o efeito do retorno às emoções como um elemento da modernidade avançada; o amor romântico nos Estados Unidos e os códigos de conduta israelitas; e o papel dos meios de comunicação em gerar emoções públicas intensas.
*
Vale a pena consultá-la.
*
**
***
**
*

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Por que as sociedades criam e conservam rituais envolvendo seus mortos?

Mauro Guilherme Pinheiro Koury
*
Por que as sociedades criam e conservam rituais envolvendo os seus mortos? Em geral, qual a função desses rituais para as mesmas? Estas são questões que perpassam a mente da maioria das pessoas, preocupadas com a questão sobre a vida e a morte e, principalmente, do processo de passagem entre vida e morte, individualmente e socialmente.

Em uma abordagem antropológica, é possível verificar que o ritual de passagem simbolizado pelo ritual mortuário toca questões fundamentais para a compreensão da relação indivíduo, sociedade e natureza. O rito de passagem mortuário discute a continuidade do social e o novo equilíbrio societário entre as forças da natureza e da sociedade, a partir de uma morte singular, individual. Todo processo ritual funerário e do luto a ele relacionado prevê e dá importância aos processos de reintegração do social consigo mesmo, e dos indivíduos envolvidos pela morte, seja este sujeito o próprio morto, - para onde se busca uma reintegração do social pelas barreiras impostas a ele, e aos novos significados sociais também a ele atribuídos, - seja as que ficam e lamentam a perda.

O ritual dos mortos é uma prática social que tem como função, entre outras, a de dominar e integrar a morte no interior de uma sociabilidade dada. A morte passa a ser social, através dos rituais impostos a ela. Em sociedades onde o espírito de coletividade era mais evidenciado, a morte trazia em evidência um corpo individualizado daquele que morreu criando uma espécie de tensão entre a composição biológica do sujeito e a composição social do mesmo, deixando as sociabilidades onde ocorreu a morte em crise. Os rituais da morte serviriam para repor o corpo morto (biológico) individualizado nas malhas do social. Servia como uma espécie de integração do morto (e da morte) ao social.

A morte, através do corpo morto, deixava de representar uma ameaça a uma dissolução do social, ou a partes dele, e passava a integrar todo uma composição de re-socialização do sujeito morto (e os entes queridos que permanecem) à prática e a visão de mundo de uma sociabilidade específica.

Os rituais servem como uma espécie de domação da morte pelo social. Ela passa a fazer parte de regras sociais, ditadas pelo social e com uma função específica naquele social. Uma delas é a integração do sujeito morto e da dor dos que ficam ao cotidiano societário, outra delas é domar a natureza, integrando o corpo morto ao social e sentindo-se transformador da morte: a cultura dispondo a natureza às suas regras e controle, como forma de subsistência da própria sociedade. A outra, esta relacionada como o mundo sobrenatural. O corpo morto não entregue a prática ritual é um corpo morto em possível danação, que pode querer vingar-se dos vivos e da sociedade onde emergiu. Desta forma, os rituais também buscam domar o sobrenatural através da indicação da passagem do morto para o além. Desta forma, os rituais funerários, os rituais do luto são rituais integradores do sujeito morto e da dor dos que ficam a uma cotidianidade de uma sociabilidade qualquer, como forma de domesticação da morte à visão de mundo desta mesma sociabilidade.

O luto tem o papel de reintegração dos que ficam na cotidianidade de suas vidas, e na cotidianidade de uma sociabilidade específica onde vivem. A dor do luto é uma dor necessária. A psicanálise diz que não é doença, mais uma forma de introjeção do morto nos que ficam. Uma forma de suprir o outro que se foi, o fazendo viver sentimentalmente no interior dos sujeitos que ficam e para quem o morto era querido.

Poderia-se, aqui, perguntar porque a pessoa, por mais pobre que seja, quer tratar seus mortos com dignidade e respeito? A resposta a esta questão está relacionada ao papel dos indivíduos na sociedade, aos sentidos atribuídos socialmente aos sujeitos sociais em vida, onde crenças, desejos, projetos, expectativas dão movimento às práticas sociais e, aos significados indicativos da esfera da morte e dos mortos como extensão e configuração de um social dado.

Pode-se indicar, assim, que a pessoa que perde alguém é uma pessoa ligada a uma prática social específica, tanto quanto a que morreu. Uma pessoa socializada dentro de uma perspectiva de mundo, onde uma ética, um conjunto de emoções, e uma espiritualidade específica, formam um olhar específico sobre si mesmo e os outros próximos e distantes. Esta forma de olhar, é sempre socialmente datada, faz parte de um tempo e um espaço determinado, e comanda noções de dignidade e respeito, que tem a ver com o acesso ao corpo e os exercícios do transpasse do morto pelos rituais funerários e pelos rituais religiosos onde também estão ligados.

É importante, neste momento, pensar aqui que a Religião, para a antropologia, é vista como uma construção social também, mas que remete a uma forma de sociabilidade onde o coletivo é superior aos atos individualizados. A crença na outra vida, uma forma de domar a morte pela vida eterna, faz com que não se deseje o espírito morto vagando. É necessário encaminhá-lo, através dos rituais a um destino específico. As flores, por exemplo, sempre tiveram um significado de ligação com o conceito de paraíso a um jardim, o jardim de éden. Por isso, no Brasil, nas práticas cristãs funerárias, a partir do século XIX, são incorporadas à preparação do corpo morto e as homenagens para com ele.

Tratar os mortos com dignidade e respeito é uma forma primeira de referenciá-los através das práticas sociais a que os indivíduos sociais estão submetidos enquanto pessoas, isto é, é também uma forma de referenciar a si mesmo, enquanto cidadão e enquanto família, e enquanto religião, e enquanto laços de amizades e vizinhança. É uma forma também de se permitir saber que o corpo morto é um corpo domado. A ausência de um corpo na morte da insegurança aos entes queridos sobre a própria morte do sujeito, e não permite que os que ficam façam luto. O luto é uma forma de internalização do sujeito morto nos que ficam. Para a psicanálise, uma dor necessária para uma reintegração dos que sofrem à vida, para a antropologia e a sociologia, uma dor que precisa ser ritualizada para que os que a sofrem possam reintegrar-se a uma cotidianidade, e ao dia a dia social.

Por outro lado, a crença nos rituais integradores, onde os funerários então inclusos, além da necessidade de visualização do corpo morto, do certificar-se de sua morte, precisa também de práticas outras que o permitam fazer o transpasse deste corpo morto para novas realidades, do sobrenatural, por exemplo. Cheio de regras e formas rituais de passagem. Além da questão de higiene pessoal, dos que ficam, e societárias. Um corpo morto necessita de um destino, senão contamina os vivos, pela putrefação do cadáver, entre outros elementos nocivos à saúde pública, e também pela visão simbólica que diferencia o corpo humano do corpo animal. O tratamento não humano aos humanos parece tornar o corpo descuidado em um corpo animalesco, e os próprios entes queridos animais, se não há cuidado ritual com o corpo que se foi. De novo a relação natureza versus cultura.

Porque a maioria das sociedades enterra seus mortos

Outra questão significativa, quando se procurar refletir sobre a prática ritualística mortuária, e conseqüência do que vem discutindo até aqui neste ensaio, é o porquê a maioria das sociedades enterra seus mortos. Daí uma pergunta antecedente: houve alguma sociedade ou existiu um tempo em que isso não acontecia? O que leva a uma análise comparativa e se chega à conclusão inicial de que a prática de enterro dos mortos não é necessariamente a única prática ritual de despacho dos mortos. Existem sociedades que cremam os corpos, a hindu, por exemplo, e as cinzas do sujeito são jogadas nos rios para serem levadas para o mar, como um simbolismo de passagem para o além.

Várias sociedades, no entanto, caminham para a prática do enterro como uma forma de reintegração do sujeito a terra: uma espécie de simbolismo entre natureza, sociedade e sobrenatural. O sujeito se decompõe, e a decomposição acompanha, em muitas sociedades, a natureza dos rituais. Algumas sociedades africanas fazem mais de um enterramento do cadáver, entre o ato da morte e o ato final de retirada dos ossos. Cada ato ritual acompanha o desenterramento e o novo enterro e tem funções específicas do controle do espírito do que se foi e do luto dos que ficam até a liberação dos que permanecem e do que se foi à restauração de suas vidas na cotidianidade social.

Na sociedade ocidental, os enterros tal como nós os vemos no hoje é algo recente e diz respeito ao tipo de sociabilidade que emergiu onde o indivíduo tem uma supremacia relativa sobre o social. Podemos pensar nesse processo de individualização do social na sociedade ocidental a partir do século XII, mas as formas rituais ditas modernas têm sua configuração no final do século XVIII em diante.

Na idade média, os mortos importantes, clérigos e alguns reis e poderosos, eram enterrados na igreja, no interior da igreja. Os mortos comuns eram enterrados nas estradas, ou em covas comuns perto das igrejas. Os corpos eram jogados uns acima dos outros, num buraco constantemente aberto.

Posteriormente, com a higienização das cidades, os cemitérios foram afastados das cidades e os mortos começaram a ser neles depositados. Os cemitérios eram de ordens religiosas e eram tidos como uma espécie de campo santo. Nele, os mortos tinham um destino mais perto do Senhor.
Tem histórias que relatam fatos tragicômicos: a maioria dos homens comuns não possuía renda suficiente para enterrar os seus mortos nos cemitérios. Era comum, então, que na calada da noite corpos mortos fossem arremessados de fora para dentro dos cemitérios, ou se penduravam corpos em árvores que tivessem galho para dentro do cemitério, como forma de proteger os seus mortos.

A briga para se ter um corpo morto salvo era premente.

Por outro lado os cemitérios não causavam medo ou receio, como agora. Os cemitérios eram locais onde sociabilidades emergiam: feiras livres, locais de namoro clandestino, ou de paquerar, trocas e encontros diversos eram realizados no interior dos seus muros.

Só com a política de higienização do século XIX é que as regras de saneamento passam a reconfigurar os rituais fúnebres. Os sete palmos de terra mínimos, as covas individualizadas, os mausoléus indicando a importância dos mortos, a cova rasa com uma cruz, simbolizando entrega do morto para Cristo, etc, bem como a distribuição espacial interna ao cemitério revelando uma hierarquização dos mortos em seu interior.

Os cemitérios desde os finais do século XIX passam simbolicamente a representar a sociedade dos vivos. A distribuição por alas e quarteirões, o valor econômico depositado em cada ala, quadra ou quarteirão, os materiais utilizados, mármores, granito, até o cimento comum à cova rasa, significando um assentamento posicional significativo do sujeito morto ou dos familiares mortos, que correspondiam ao valor simbólico, econômico, político e social, do seu status e da família do qual faz parte e que continua no mundo dos vivos, assegurando o prestígio e a importância familiar na sociedade.

Daí a arquitetura representar o morto com as expectativas dos vivos que o rememoram e aos demais que circundam e reverenciam o seu poder, até as covas rasas, alugadas por dois anos e cujos ossos, não reclamados pelos familiares, são depositados em um ossuário comum; reprodução, também que satisfaz as hierarquias e situações de classe na nossa sociedade.

Até os modernos cemitérios como parques com grife, daí já significativamente determinado para uma classe social específica, ou os novos cemitérios verticais, cujos mausoléus são vendidos de acordo com a paisagem oferecida, da cidade onde eles existem etc. Estes, também, são cemitérios com grife e destinados a um público especial.

Em nossa sociabilidade, a ocidental, então, emerge e revigora o comércio fúnebre e as relações mercantis de troca, condizentes com o espírito do capital que norteiam as suas relações sociais até na morte.

O comércio fúnebre no Brasil tem início também nos finais do século XVIII e se desenvolve no XIX para cá. Antes existia o comércio religioso sobre os atos fúnebres. As famílias pagavam ou doavam casas, propriedades, dinheiro a Igreja como uma forma de conseguir um cantinho mais fácil no céu. Os enterros no interior das igrejas também eram coisas para poucos, e eram os de posse que conseguiam.

A pobreza enterrava os seus mortos em covas coletivas, pertos dos locais santos, como Igrejas e conventos, ou em terrenos próximos de suas casas e, em último caso, nas beiras de estrada. Este último, quase sempre, ligados a mortes por motivos de acidente, assassinato, ou outros tipos de mortes ocorridas no local. Com o disciplinamento dos cemitérios e a questão da higienização das cidades, as regras do enterro e a prática de uma forma de enterro específico fazem vigorar o comércio e instituições voltadas para o serviço fúnebre. Isso se dá principalmente no final do século XIX.

Implicações sociais e psicológicas de um comércio fúnebre

Na sociabilidade moderna e ocidental, onde o Brasil faz parte como legado da colonização, o comércio fúnebre visa a facilitar o despacho e o transpasse do morto. Ninguém tem mais tempo de fazer sozinho o caixão, sair colhendo flores no campo, sair com ele (o caixão e o defunto dentro) nas costas, e não se pode por enterrar ou depositar o corpo em qualquer lugar, por quebrar normas de higiene, e normas de propriedade de uma sociabilidade.

O comércio fúnebre vem suprir uma prática cada vez mais individualista do ritual fúnebre. Serve também como elemento de status social, quanto mais rico e com mais adornos, quanto mais vistoso o velório e mais pomposo o enterro, mais status social o sujeito, e logicamente a família que fica possui.

No século vinte, os serviços funerários se especializam, ornamentos e enfeites, como os tipos de flores, de adornos, e outros, ficam nas mãos de especialistas. Os caixões também, os locais de velórios, o cortejo, a vaga nos cemitérios, - que deixam de ser ligada a igreja e se secularizam, passando a ser administrados pelas prefeituras locais, e dos anos setenta para cá, por setores privados, - bem como as ajudas psicológicas ao luto, psicólogos, psicanalistas, assistentes sociais, entre outros, tornam-se objetos de trabalhos especializados. Esses serviços passam a exercer uma função que antes era exercida pela sociedade como um todo, ou pela Igreja ou forma religiosa, em particular.

Os serviços de restauro, do re-equilíbrio psicológico e social da pessoa em dor, passam a ser um serviço de acompanhamento individualizado, feito por especialistas. No Brasil, por exemplo, existem Núcleos de Apoio à Pessoa Enlutada, serviços que envolvem psicólogos, médicos, assistentes sociais, sociólogos e antropólogos, que tem como função amenizar a dor do luto nos que ficam e reintegrá-los a prática cotidiana social.

Isso sem falar nos cartórios e instâncias ligados à advocacia, para discussões e repasses de possível herança dos sujeitos mortos, e dos problemas deixados por eles em vida, entre outros assuntos. Serviços que se propõem servir como intermediário, ajudando os que ficam a re-situar-se no social, pela restauração e equilíbrio moral, ético, econômico e de dignidade do que se foi. É comum aflorar vários problemas após o transpasse da pessoa, necessários de serem resolvidos para que os que ficam possam retornar a normalidade.

Sem falar na religião, que ainda detém um papel importante, tanto psicológico, - na restauração e amenização da dor dos que ficam, - como na integração do morto na outra vida, ou pelo menos nas formas de vidas que cada religião particular invocada no hoje, constrói.

Sem falar ainda nos hospitais. O homem moderno deixou de morrer em casa e passou a morrer nos hospitais. O serviço médico tornou-se imprescindível para o serviço fúnebre. O atestado de óbito, por exemplo, só pode ser dado por um médico. A medicina, na sociedade ocidental contemporânea, e no Brasil em particular, desde o final do século XIX, passam a deter o poder da vida e da morte social. Sem um atestado de óbito o sujeito não pode ser considerado morto, com todos os problemas que daí surge para os que ficam. Problemas psicológicos, econômicos, morais, etc. que dificultam os que ficam fazer o luto e retornar a uma cotidianidade específica.

A partir do século XX, por fim, a morte é comandada por uma enorme e diversificada e especializada indústria funerária.
*

Indicações Bibliograficas

KOURY, Mauro Guilherme Pinheiro. Sociologia da Emoção. O Brasil Urbano sob a Ótica do Luto. Petrópolis, Vozes, 2003

BORGES, Maria Elizia. Arte Funerária no Brasil (1890-1930). Belo Horizonte, Editora C/Arte, 2002

ARIÈS, Philippe. The Hour of Our Death. New York, Alfred A. Knopf, 1981
*
[Texto publicado no Diário de Santa Maria (Caderno Mix), Santa Maria, RS, p. 14 - 15, 24 jan. 2004].
*

domingo, 25 de outubro de 2009

*
Será lançado, nos primeiros meses de 2010, o novo livro do Prof. Mauro Guilherme Pinheiro Koury, intitulado: Relações Delicadas: Ensaios sobre fotografia e sociedade, com o selo da Editora Universitária-UFPB.
*
Esta coletânea de estudos críticos sobre fotografia e sociedade será lançada no ano em que o Grupo Interdisciplinar de Estudos da Imagem - GREI, completa 15 anos de atividades initerruptas como base de pesquisa CNPq-UFPB.
*
O GREI é o irmão e parceiro do GREM. Os dois são grupos de pesquisa liderados pelo Prof. Mauro Koury (DCS/CCHLA/UFPB).
*
**
***
**
*

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Lançamento do Caderno CRH n. 56

O Caderno CRH n. 56, da Universidade Federal da Bahia, será lançado durante o coquetel de lançamentos do Encontro Anual da ANPOCS, em Caxambú, MG, às 21:00 do dia 26 de outubro de 2009.
*

*
*

*
Vale a pena conferir!
***
**
*

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

RBSE - Revista Brasileira de Sociologia da Emoção

*
A RBSE - Revista Brasileira de Sociologia da Emoção está recebendo artigos, resenhas, traduções para os próximos números de 2010 [v. 9 n. 25(abril/10); n. 26 (agosto/10) e n. 27 (dezembro/10)]
*
Contribuições podem ser encaminhadas através do email grem@cchla.ufpb.br (aos cuidados de Letícia Knutt).
*
As Normas para publicação podem ser visualisadas no site da revista http://www.cchla.ufpb.br/rbse/Index.html
*
O editor
*
***
**
*

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Dica do GREM: Assistam A Casa dos Mortos

Um grande filme de valor etnográfico que vale a pena conferir:
*
Título: A CASA DOS MORTOS
*
Direção: Débora Diniz.
*
Débora Diniz é antropológa da Universidade de Brasília (UnB).
*
O filme é uma etnografia sobre a loucura, a solidão e a morte em vida. Através de narrativas apresenta e discute a loucura e o papel das intituições na sociedade brasileira atual.
*
O Filme A CASA DOS MORTOS pode ser visto na íntegra, no site: http://www.acasadosmortos.org.br/ .
*
**
***

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Rituais da Morte e Serviços Funerários
*
(Entrevista para o jornal Correio da Bahia: perguntas elaboradas pelo jornalista Jean Wyllys, em 08 de junho de 2000). Ainda fazendo parte das comemorações dos 15 anos do GREM
*
*
JW – Caro Professor Mauro Koury, gostaria de iniciar este diálogo agradecendo a forma extremamente gentil com que aceitou de imediato abrir um espaço do seu tempo para esta entrevista breve.
*
MK – Eu que agradeço a oportunidade de falar sobre a minha pesquisa que discute a relação luto e sociedade urbana no Brasil.
*
JW – Gostaria de imediato, que o senhor se apresentasse.
*
MK – Sou professor e pesquisador vinculado ao Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal da Paraíba e ao seu programa de pós-graduação em sociologia. Coordeno dois grupos de pesquisas, que são bases consolidadas de pesquisa do CNPq na UFPB desde o ano de 1994. O primeiro Grupo chama-se GREM – Grupo de Pesquisa em Antropologia e Sociologia das Emoções, onde a pesquisa ‘Luto e Sociedade’ encontra-se em desenvolvimento, com vários estudantes bolsistas e voluntários de graduação e pós-graduação. O outro grupo tem o nome de GREI – Grupo Interdisciplinar de Estudos em Imagem.
*
JW – Obrigado pela apresentação. Mas, por tempo jornalístico, vamos direto às questões que me trouxe ao senhor.
*
MK – Ok!
*
JW – Vamos, então a primeira pergunta: Por que as sociedades criaram e conservam rituais envolvendo seus mortos? Em geral, qual a função desses rituais para as mesmas?
*
MK - O ritual dos mortos é uma prática social que tem como função, entre outras, a de dominar e integrar a morte no interior de uma sociabilidade dada. A morte passa a ser social através dos rituais a ela impostos. Em sociedades onde o espírito de coletividade era mais evidenciado, a morte trazia em evidência um corpo individualizado daquele que morreu criando uma espécie de tensão entre a composição biológica do sujeito e a composição social do mesmo, deixando as sociabilidades onde ocorreu a morte em crise. Os rituais da morte serviriam, assim, para repor o corpo morto (biológico) individualizado nas malhas do social. Servia como uma espécie de integração do morto (e da morte) ao social.
A morte, através do corpo morto, deixava assim de representar uma ameaça a uma dissolução do social, ou a partes dele, e passava a integrar todo uma composição de re-socialização do sujeito morto (e os entes queridos que permanecem) à prática e a visão de mundo de uma sociabilidade específica.
Os rituais servem assim como uma espécie de domação da morte pelo social. Ela passa a fazer parte de regras sociais, ditadas pelo social e com uma função específica naquele social. Uma delas é a integração do sujeito morto e da dor dos que ficam ao cotidiano societário, outra delas é domar a natureza, integrando o corpo morto ao social e sentindo-se transformador da morte: a cultura dispondo a natureza às suas regras e controle, como forma de subsistência da própria sociedade. A outra, esta relacionada como o mundo sobrenatural. O corpo morto não entregue a prática ritual é um corpo morto em possível danação, que pode querer vingar-se dos vivos e da sociedade onde emergiu. Desta forma, os rituais também buscam domar o sobrenatural através da indicação da passagem do morto para o além. Desta forma, os rituais funerários, os rituais do luto são rituais integradores do sujeito morto e da dor dos que ficam a uma cotidianidade de uma sociabilidade qualquer, como forma de domesticação da morte à visão de mundo desta mesma sociabilidade.
*
JW - Por que a pessoa, por mais pobre que seja, quer tratar seus mortos com dignidade e respeito?
*
MK - Primeiro, porque a pessoa que perde alguém é uma pessoa ligada a uma prática social específica, tanto quanto a que morreu. Uma pessoa socializada dentro de uma perspectiva de mundo, onde uma ética, um conjunto de emoções, e uma espiritualidade específica, formam um olhar específico sobre si mesmo e os outros próximos e distantes. Esta forma de olhar (socialmente datado tempo e espacialmente) comanda noções de dignidade e respeito, que tem a ver com o acesso ao corpo e os exercícios do transpasse do morto pelos rituais funerários e pelos rituais religiosos onde também estão ligados. Pensar aqui que a Religião é uma construção social também, mas que remete a uma forma de sociabilidade onde o coletivo é superior aos atos individualizados. A crença na outra vida, uma forma de domar a morte pela vida eterna, faz com que não se deseje o espírito morto vagando. É necessário encaminhá-lo, através dos rituais a um destino específico.
Tratar os mortos com dignidade e respeito é uma forma de referenciar os mortos, através das práticas sociais a que os indivíduos estão submetidos enquanto pessoa; e é também uma forma de referenciar a si mesmo, enquanto cidadão e enquanto família, e enquanto religião, e enquanto laços de amizades e vizinhança. É uma forma também de se permitir saber que o corpo morto é um corpo domado. A ausência de um corpo na morte da insegurança aos entes queridos sobre a própria morte do sujeito, e não permite que os que ficam façam luto. O luto é uma forma de internalização do sujeito morto nos que ficam. Para a psicanálise, uma dor necessária para uma reintegração dos que sofrem à vida, para a antropologia e a sociologia, uma dor que precisa ser ritualizada para que os que a sofrem possam reintegrar-se a uma cotidianidade, ao dia a dia social.
Por outro lado, a crença nos rituais integradores, onde os funerários então inclusos, além da necessidade de visualização do corpo morto, do certificar-se de sua morte, precisam também de práticas outras que o permitam fazer o transpasse deste corpo morto para novas realidades, do sobrenatural, por exemplo. Cheio de regras e formas rituais de passagem. Além da questão de higiene pessoal, dos que ficam, e societárias. Um corpo morto necessita de um destino, senão contamina os vivos, pela putrefação do cadáver, etc. Também pode tornar-se um corpo animalesco, e os próprios entes queridos animais, se não há cuidado ritual com o corpo que se foi. De novo a relação natureza versus cultura.
*
JW - Por que a maioria das sociedades enterra seus mortos? Houve alguma sociedade ou tempo em que isso não acontecia?
*
MK - A prática de enterro dos mortos não é necessariamente a única prática ritual de despacho dos mortos. Existem sociedades que cremam os corpos, a hindu, por exemplo, e as cinzas do sujeito são jogadas nos rios para serem levadas para o mar, como um simbolismo de passagem para o além.
Várias sociedades, no entanto, caminham para a prática do enterro como uma forma de reintegração do sujeito a terra: uma espécie de simbolismo entre natureza/sociedade/sobrenatural. O sujeito se decompõe, e a decomposição acompanha, em muitas sociedades, a natureza dos rituais. Algumas sociedades africanas fazem mais de um enterramento do cadáver, entre o ato da morte e o ato final de retirada dos ossos. Cada ato ritual acompanha o desenterramento e o novo enterro e tem funções específicas do controle do espírito do que se foi e do luto dos que ficam até a liberação dos que ficam e do que se foi à restauração de suas vidas na cotidianidade social.
Na sociedade ocidental, os enterros tal como os nós os vemos no hoje é algo recente e diz respeito ao tipo de sociabilidade que emergiu onde o indivíduo tem uma supremacia relativa sobre o social. Podemos pensar nesse processo de individualização do social na sociedade ocidental a partir do século XII, mas as formas rituais ditas modernas têm sua configuração no final do século XVIII em diante.
Na idade média, os mortos importantes, clérigos e alguns reis e poderosos, eram enterrados na igreja, no interior da igreja. Os mortos comuns eram enterrados nas estradas, ou em covas comuns perto das igrejas. Os corpos eram jogados uns acima dos outros, num buraco constantemente aberto.
Posteriormente, com a higienização das cidades, os cemitérios foram afastados das cidades e os mortos começaram a ser depositados nele. Os cemitérios eram de ordens religiosos e eram tidos como uma espécie de "campo santo". Nele, os mortos tinham um destino mais perto do Senhor.
Tem histórias que relatam fatos tragicômicos: a maioria dos homens comuns não possuía renda suficiente para enterrar os seus mortos nos cemitérios. Era comum, então, que na calada da noite corpos mortos fossem arremessados de fora para dentro dos cemitérios, ou se penduravam corpos em árvores que tivessem galho para dentro do cemitério, como forma de proteger os seus mortos.
A briga de ter um corpo morto a salvo era assim premente.
Por outro lado os cemitérios não causavam medo ou receio, como agora, era um local onde sociabilidades emergiam: feiras livres, locais de namoro clandestino, ou de paquerar, trocas e encontros diversos eram realizados no interior dos seus muros. Só com a política de higienização do século XIX é que as regras de saneamento passam a reconfigurar os rituais fúnebres. Os sete palmos de terra mínimos, as covas individualizadas, os mausoléus indicando a importância dos mortos, a cova rasa com uma cruz, simbolizando entrega do morto para Cristo, etc.
É aí que em nossa sociabilidade, a ocidental, que emerge e revigora um comércio fúnebre...
*
JW - Quando se iniciou o comércio fúnebre no Brasil, especificamente a instituição das funerárias?
*
MK - O comércio fúnebre no Brasil tem início também nos finais do século XVIII e se desenvolve no XIX para cá. Antes existia o comércio religioso sobre os atos fúnebres. As famílias pagavam ou doavam casas, propriedades, dinheiro a Igreja como uma forma de conseguir um cantinho mais fácil no céu. Os enterros no interior das igrejas também eram coisas para poucos, e eram os de posse que conseguiam.
A pobreza enterrava os seus mortos em covas coletivas, pertos dos locais santos (Igrejas e conventos), os perto de suas casas e beiras de estrada. Com o disciplinamento dos cemitérios e a questão da higienização das cidades, as regras do enterro e a prática de uma forma de enterro específico fazem vigorar o comércio e instituições voltadas para o serviço fúnebre. Isso se dá principalmente no final do século XIX.
*
JW - Quais as implicações sociais de um comércio fúnebre? E psicológicas (se é possível que você responda a essa pergunta)?
*
MK - Na sociabilidade moderna, ocidental, onde o Brasil faz parte como legado da colonização, o comércio fúnebre visa a facilitar o despacho e o transpasse do morto. Ninguém tem mais tempo de fazer sozinho o caixão, sair colhendo flores no campo, sair com ele (o caixão e o defunto dentro) nas costas, e não se pode por enterrar ou depositar o corpo em qualquer lugar, por quebrar normas de higiene, e normas de propriedade de uma sociabilidade.
O comércio fúnebre vem, assim, suprir uma prática cada vez mais individualista do ritual fúnebre. Serve também como elemento de status social, quanto mais rico e adonardo, quanto mais vistoso o velório e mais pomposo o enterro, mais status social o sujeito, e logicamente a família que fica possui.
No século vinte, os serviços funerários se especializam, ornamentos e enfeites: tipo flores, adornos, etc., ficam nas mãos de especialistas, caixões também, locais de velórios, cortejo, vaga nos cemitérios (que deixam de ser ligados à igreja e se secularizam, passando a ser administrados pelas prefeituras locais, e dos anos setenta para cá, por setores privados), bem como as ajudas psicológicas ao luto, psicólogos, psicanalistas, assistentes sociais, entre outros, passam a exercer uma função que antes era exercida pela sociedade como um todo, ou pela Igreja em particular. Os serviços de restauro da pessoa em dor passam a ser um serviço de acompanhamento individualizado. No Brasil, por exemplo, existem Núcleos de Apoio à Pessoa Enlutada, serviços que envolvem psicólogos, médicos, assistentes sociais, sociólogos e antropólogos, que tem como função amenizar a dor do luto nos que ficam e reintegrá-los a prática cotidiana social.
Isso sem falar nos cartórios e instâncias ligados a advocacia, para agendamento da herança dos sujeitos mortos, problemas deixados em vida, etc. Ajudando os que ficam a resituar-se no social, pela restauração e equilíbrio moral, ético, econômico e de dignidade do que se foi. É comum aflorar vários problemas após o transpasse da pessoa que é necessário ser resolvido para que os que ficam possam retornar a normalidade.
Sem falar na religião, onde ainda detém um papel importante: tanto psicológico, na restauração e amenização da dor dos que ficam; como na integração do morto na outra vida (ou pelo menos nas formas de vidas que cada religião particular invocada no hoje, constrói).
Sem falar ainda nos hospitais. O homem moderno deixou de morrer em casa e passou a morrer nos hospitais. O serviço médico tornou-se assim imprescindível para o serviço fúnebre. O atestado de óbito, por exemplo, só pode ser dado por um médico. Eles detêm o poder da vida e da morte social. Sem um atestado de óbito o sujeito não pode ser considerado morto, com todos os problemas que daí surge para os que ficam. Problemas psicológicos, econômicos, morais, etc. que dificultam os que ficam fazer o luto e retornar a uma cotidianidade específica.
A partir do século XX, a morte é comandada por uma enorme e diversificada e especializada indústria funerária.
*
JW - Qual o papel do luto e das flores?
*
MK - O luto, como eu já indiquei acima, tem o papel de reintegração dos que ficam na cotidianidade de suas vidas, e na cotidianidade de uma sociabilidade específica onde vivem. A dor do luto é assim uma dor necessária. A psicanálise diz que não é doença, mais uma forma de introjeção do morto nos que ficam. Uma forma de suprir o outro que se foi, o fazendo viver sentimentalmente no interior dos sujeitos que ficam e para quem o morto era querido.
As flores sempre tiveram um significado de ligação com o conceito de paraíso a um jardim, o jardim de éden. Por isso, nas práticas cristãs funerárias, a partir do século XIX, é incorporada a preparação do corpo morto e a homenagem para com ele, no Brasil
*
JW - Bem, é só. Muito obrigado professor.
*
MK - Não há de que. Eu que agradeço.
*
**
*

terça-feira, 29 de setembro de 2009

Luto e Sociedade

*
Veja a resenha do livro de Koury, MGP, Sociologia da Emoção: o Brasil urbano sob a ótica do luto, Petrópolis, Vozes, 2003, saída na revista Política & Trabalho, n. 21, pp. 173-174, de outubro de 2004, no site:
*
A resenha é da pesquisadora do GREM Maria Sandra Rodrigues dos Santos.
*
**
***

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Sessão especial da Câmara Municipal de João Pessoa, Paraíba, homenageia profissionais da fotografia.
*
*
A sessão especial alusiva ao Dia Mundial da Fotografia, ocorrida na última sexta-feira (11 de setembro de 2009), levou ao plenário da Câmara Municipal de João Pessoa aproximadamente 150 pessoas, que prestigiaram a homenagem aos grandes nomes da fotografia paraibana.
*
Troféu Lambe-Lambe – Aproximadamente 70 profissionais da fotografia, foram homenageados com a entrega do Troféu Lambe-Lambe que, ao longo de quinze anos, representa a maior premiação de fotografia na Paraíba, - entre os profissionais homenageados se encontra o Professor Mauro Guilherme Pinheiro Koury, na categoria de pesquisador e antropólogo visual e da imagem, coordenador do GREI – Grupo Interdisciplinar de Estudos sobre a Imagem e do GREM – Grupo de Pesquisa em Antropologia e Sociologia das Emoções, da Universidade Federal da Paraíba.
*
A entrega dos troféus reconheceu publicamente o trabalho de fotógrafos, fotógrafas e pesquisadores da fotografia que ao longo do tempo deixaram suas contribuições para o fortalecimento da fotografia paraibana.
*
Mais informações sobre a sessão podem ser lidas no Blog Fórum da Fotografia Paraíbana no endereço: http://forumdafotografiaparaibana.blogspot.com/2009/09/sessao-especial-homenageia.html
*
Ou no Blog da Agência Ensaio, no endereço: http://www.agenciaensaio.blogspot.com/
*
**
***
**
*

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

UFG realiza Seminário sobre Sexualidades e Religiosidades

O Ser-Tão, Núcleo de Estudos e Pesquisas em Gênero e Sexualidade da UFG, em parceria com a ONG Católicas pelo Direito de Decidir, a Rede de Educação Cidadã (Goiás) e o Grupo Transas do Corpo, promovem o II Seminário Das margens aos centros: sexualidades e religiosidades.
*
O evento será realizado no dia 8 de outubro de 2009, quinta-feira, no mini-auditório da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Goiás, na Praça Universitária, e reunirá pesquisadores, estudantes, ativistas e demais interessados.
*
Estão previstas duas mesas-redondas com amplo espaço para debates. No período matutino o tema abordado será “História das religiões e os direitos sexuais e reprodutivos”, enquanto à tarde o foco das discussões passa a priorizar os “Fundamentalismos religiosos e Estado laico”. Ao final do dia será exibido o documentário “Questão de Gênero”, de Rodrigo Najar, marcando o encerramento do evento.
*
As inscrições são gratuitas e serão realizadas no dia e local do evento.
*
A programação e demais informações estão também disponíveis na página www.sertao.ufg.br/seminario2.
*
PROGRAMAÇAO do II Seminário Das margens aos centros: sexualidade e Religiosidades
*
8 de outubro, quinta-feira 8:30 h – Mesa de Abertura
*
9 h - Mesa: História das religiões e os direitos sexuais e reprodutivos
*
Participantes:
· Yury Puello Orozco (Doutora em Ciências da Religião e membro da ONG Católicas Pelo Direito de Decidir).
· Janira Sodré Miranda (Doutoranda em História pela UnB, Pesquisadora na UCG e membro do Coletivo Negro do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Goiás - IFG)
· Paulo Petronilio (Doutor em filosofia da educação pela UFRGS)
*
14 h - Mesa: Fundamentalismos religiosos e Estado laico
*
Conferencistas:
· Natalia Mori Cruz (Mestre em Sociologia e integrante da direção colegiada do Cfemea/DF)· Maria José Rosado Nunes (Doutora em Sociologia, professora da PUC/SP e coordenadora geral da ONG Católicas Pelo Direito de Decidir)
· Daniel Sottomaior (Formado em engenharia. Fundador da Campanha Brasil para Todos, da Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos e da Associação Brasileira da Defesa da Laicidade do Estado).
*
17 h – Exibição do documentário “Questão de Gênero”, de Rodrigo Najar
*
**
***

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

A política como sujeira


*
*
Mauro Guilherme Pinheiro Koury
*
*
Em uma enquete realizada sobre sujeira e imaginário social urbano no Brasil, em seis cidades brasileiras: João Pessoa, Recife, Belém, Brasília, São Paulo e Curitiba, entre os meses de abril e maio de 2009, foram perguntados a 390 brasileiros, entre outras questões, o que eles mais achavam sujo ou consideravam sujeira. As respostas foram várias, desde falta de higiene, até respostas homofóbicas e discriminatórias. Mas o que chamou atenção foi o grande número de respondentes que afirmaram a política brasileira como algo sujo, 26,6%. É sobre esse conjunto amostral, de 104 pessoas, que este artigo versará.
Os 26,6% de brasileiros que indicaram como sujeira a política brasileira, ao serem distribuídos pelas seis capitais de estados pesquisadas, se situam do seguinte modo: 23,4% da cidade de João Pessoa (PB); 38,3% de Recife (PE); 28,4% de Belém (PA); 21,1% de São Paulo (SP); 16,6% de Curitiba (PR) e 35% de Brasília (DF). O maior índice de indicação da política nacional como algo sujo foi encontrado entre os moradores da cidade do Recife, seguido de perto por Brasília. Os menores índices de indicação foram encontrados entre os respondentes de Curitiba, seguido pelos residentes na cidade de São Paulo.
As duas grandes categorias onde as diversas respostas individuais dos entrevistados foram agregadas, relativas à questão da política como algo sujo, falam da Falta de Zelo com a Coisa Pública, com 15,1% das indicações, e Desrespeito ao Cidadão, com 11,5% das respostas nacionais. Por falta de zelo com a coisa pública os entrevistados são claros na comparação da política praticada por políticos profissionais no Brasil como sujeira, nas esferas federal, estadual e municipal, pela indicação da corrupção ativa, e do legislar e agir em causa própria. Os escândalos que a sociedade brasileira vivencia desde os anos finais do século vinte até agora, como o de desvio de verbas públicas, o mensalão, a operação vampiro e outras, subornos, contratações ilícitas no congresso, enriquecimentos rápidos e inexplicáveis de políticos, uso da máquina pública para cabide das mais diversas práticas abusivas de beneficiamento da família ou pessoal, o eterno acabar em pizza das CPIs, os partidos como cabides de interesses estratégicos para uso pessoal, a falta de ética como fundamento partidário e da política no país, entre inúmeros outros, são apontados pelos entrevistados como sendo a prática política no Brasil. O que os fazem ter nojo da política e dos políticos no Brasil considerados, como disse um entrevistado recifense, “como um bando de porcos no chiqueiro, quando aparece alguma lavagem (a mistura de restos de comida com que são alimentados os porcos criados em fundos de quintais)”.
Por desrespeito ao cidadão, por outro lado, os entrevistados indicam, entre outras comparações, a de que os políticos “só aparecem quando querem se eleger, depois esquece o eleitorado”. Esta afirmação geral dada por um entrevistado da cidade de Belém sintetiza, grosso modo, uma boa parte das mágoas com a política por parte do homem comum urbano brasileiro. Essa queixa trás embutida outras tantas, que dizem respeito, principalmente, ao poder executivo. Embora, em muitos casos, revele ainda uma mentalidade clientelista por parte do eleitorado, da relação político-eleitor.
Promessas pessoais feitas durante a campanha para possíveis eleitores e depois esquecidas quando conseguem assumir algum posto no legislativo ou no executivo, são apontadas por alguns entrevistados, que se colocam descrentes do voto e aproximam a prática política da podridão, do político como aproveitador, da política como sujeira. Por outro lado, grande maioria das respostas reside no descumprimento de promessas de campanha para melhorias na infra-estrutura urbana, a partir do próprio bairro ou comunidade do eleitor.
Outro núcleo grande de indicações do desrespeito ao cidadão se coloca em alguns problemas de âmbito mais geral que atingem os moradores das cidades entrevistadas, como o episódio até hoje não resolvido do lixo na cidade do Recife, os problemas de transporte urbano, o estado de falência em que se encontram estradas, avenidas e ruas em todo o país, dificultando a circulação de automóveis e pessoas, aumentando o número de acidentes de trânsito e o trafego diário das vias públicas.
Outro conjunto de respostas indica a falta de iluminação pública, o que dificulta a circulação de pessoas, principalmente aquelas mais pobres, gerando medo. Outro aspecto associado como desrespeito ao cidadão, e indicativo da política como algo que dá nojo, fala da saúde pública, e das dificuldades do seu uso e do desaparelhamento dos hospitais e postos de saúde no Brasil; da educação formal e do esfacelamento da escola pública, nos três níveis, no país; falam ainda do distanciamento salarial dos políticos profissionais, bem como dos outros poderes, em relação ao salário do trabalhador comum, entre outros tantos aspectos.
Outro núcleo de indicações fala diretamente da questão do trato da violência como fazendo parte de um comércio e uma indústria mortal. Indicam os políticos em cargos legislativos e executivos como os responsáveis pelo acirramento da violência no país, não por falta de recursos aplicados, mas pelo desvio destes recursos, seja em propaganda, seja por outras formas: despreparo das forças públicas, falta de policiamento estratégico, desinteresse real da questão, embora com aparente interesse da eterna fonte de recursos para estimular este comércio e indústria nos municípios, estados e país, ampliando a cultura do medo entre os cidadãos.
Este núcleo que coloca a questão do trato da violência se desdobra por outra categoria indicada pelos entrevistados e que não será tratada aqui, que é a da Violência Urbana. Esta categoria, responde sozinha por 19,7% das indicações dos 390 entrevistados no Brasil que a visualizaram com sujeira. O que interessa aqui é mostrar a associação da política como um fato do desrespeito ao cidadão, inclusive no trato da violência pela res publica, isto é, como uma coisa do povo.
Em um ano pré-eleitoral, como 2009, onde começam a se encenar toda uma movimentação para renovação de cargos nos poder legislativo federal e estadual, bem como nos poderes executivos dos estados e do país, é interessante mostrar como a população brasileira vê e sente a política em desenvolvimento no país através dos seus políticos profissionais. A falta de ética, o uso pessoal e partidário da máquina política, o desrespeito ao cidadão, são apontados como problemas estruturais da política no país que levam a descrença do eleitor para o destino de seu voto: “em qualquer político novo ou antigo que se vote, ele assumiu o poder vira um safado igual aos demais que só pensa no seu bolso e no seu benefício”, sintetiza uma entrevistada de João Pessoa, e o fazem ver a política como algo sujo.
É bem verdade que uma pesquisa realizada em 2005 pelo Ibope, mostrou que 67% dos entrevistados diziam que se estivessem no poder faziam a mesma coisa que os políticos que lá estão: roubar e colocar a máquina política a seu favor. O que mostra o imaginário do jeitinho pessoal já tratado pelo antropólogo carioca Roberto DaMatta em vários ensaios sobre a forma de ser do brasileiro. Ou da expressão popular: “rouba, mas faz”, como forma síntese do político que se dá bem, mas também executa obras, tão comum na política nacional desde meados da década de cinquenta do século passado. Nunca, porém, a política foi tão mal vista no imaginário popular como nos últimos anos.
Em várias respostas os entrevistados ampliavam o seu argumento com a indicação do votar porque é obrigado, e da intenção de votar nulo ou em branco, pois todos os políticos, no fundo, são iguais: o que equivale a desonestos e que só pensam em si. Espelhando a desilusão com a política, com os políticos e com os poderes constituídos no país.
Em um país onde a democracia dá os seus primeiros passos para a sua consolidação e longevidade, esta desilusão para com a política pode ser fatal. É hora dos partidos e dos políticos novos e velhos repensarem a sua prática, e fazerem uma reflexão séria sobre o significado da política e sua relação para com a nação. 2010 pode ser um grande ano para se rever as bases reflexivas do que o Brasil quer e precisa.
E o homem comum brasileiro precisa deixar de lado amarras clientelísticas que o prendem a uma política do rouba, mas faz, e partir para uma reflexão sobre sua participação como cidadão na pressão consequente sobre os descaminhos da política no país. Precisa ter consciência de que pode ajudar a ampliar o nível de oxigênio da política do país, organizando resistências às práticas por ele consideradas sujas da política: afinal, são os homens comuns, cidadãos do país, que podem impor condições de permanência ou não da política como um negócio sujo.
*
**
***

sábado, 29 de agosto de 2009

O Centro Josué de Castro, Recife, Pernambuco, Brasil, comemora 30 anos de atividade.
*
Ao comemorar 30 anos de fundação, programou para o segundo semestre de 2009 a seguinte agenda de seminários e palestras:
*

Agosto – Dia 21
09:00h – Inauguração Sala de Exposição Permanente do Centro com a mostra
da Obra do Cientista Josué de Castro
10:00h – Painel: Josué de Castro no Exílio
Ana Maria Castro – filha de Josué de Castro e doutora em sociologia
José Arlindo Soares – CJC/UFPB
*

Agosto – dia 28
19:00h – Lançamento com debate do Livro de Elenaldo Teixeira:
“Sociedade Civil e o Papel Civil das Organizações”.
Apresentação: Maria do Carmo Araújo
Debate: Tereza Wanderley- CJC
Jose Arlindo Soares – CJC/UFPB
*

Setembro – dia 01
19:00h – Mesa Redonda: Pobreza , Migração e Globalização
Rossana Rocha Reis (USP) – “Globalização e Pobreza”
Teresa Sales (Unicamp/CJC) – “Migrações Internacionais de Brasileiros”
*

Setembro – dia 11
19:00h – Seminário Fatores de Localização das Cidades do Recife, Rio de Janeiro e São Paulo
Odete Seabra (USP) – A cidade de São Paulo
Helion Póvoa Neto (IPPURR/UFRJ) – A cidade do Rio de Janeiro
Paulo Reynaldo (CJC) – A cidade do Recife
*

Setembro – dias 15 e 16
Seminário Viabilização do Semi-Árido do Nordeste (programação em parceria com o IMIP)
*

Outubro – dia 01
19:00h – Painel – Poética e Literatura na obra de Josué de Castro
Francisco Foot Hardnam - Unicamp
*

Outubro – dia 08
19:00h – Painel - Tendências atuais da Responsabilidade Social das Empresas
Josias Albuquerque - SENAC
Lúcia Pontes - CJC/JCPM
Marcos Magalhães - ICE
*

Outubro – dia 09
19:00h – Painel - Pesquisa, Mídia e Democracia Contemporânea
Antonio Lavareda- CJC/MCI
*

Outubro – dia 16
17:00h – Painel – Planejamento Participativo e Poder Local
Novas Experiências – José Arlindo Soares – CJC – UFPB
Sergio Buarque – CJC – UPE
Amélia Reynaldo - Unicap
Júlio Lóssio – Prefeito de Petrolina
Zeca Cavalcante – Prefeito de Arcoverde
Elias Gomes – Prefeito de Jaboatão

Compareçam!!
*
**

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

II SEMINÁRIO INTERNACIONAL SOBRE CULTURA, IMAGINÁRIO E MEMÓRIA DA AMÉRICA LATINA
Imaginários Juvenis Latinoamericanos: Participação, Cultura e Sociabilidade

14 a 16 de outubro de 2009 – UFPR – Curitiba - Paraná
Submissão de Trabalhos até 21/09/09, às 23h59min

Mais informações: http://www.humanas.ufpr.br/evento/ImaginariosJuvenis/

Este Seminário é uma promoção do Centro de Estudos sobre Cultura e Imagem da América Latina – CECIAL, vinculado ao Grupo de Pesquisa Imagem e Conhecimento CNPq/UFPR, do Departamento de Ciências Sociais e do Programa de Pós-Graduação em Sociologia do Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes da UFPR.

terça-feira, 25 de agosto de 2009

Anais online da II Reunião Equatorial de Antropologia

*
Foram divulgados os ANAIS online da II Reunião Equatorial de Antropologia / XI Reunião de Antropólogos do Norte e Nordeste, acontecidas na cidade de Natal, RN, entre os dias 19 a 22 de agosto de 2009.
*
Os Anais contém os trabalhos completos apresentados nos vários Grupos de Trabalho durante o Encontro, e podem ser consultados gratuítamente no endereço http://www.cchla.ufrn.br/REA2009/?pg=publi
*
**

domingo, 23 de agosto de 2009


PROGRAMAÇÃO COMPLETA
*
Quarta-feira – 26/08/09
LOCAL: Pantheon18h
Inscrições
18h30
Olhares Cruzados: movimentos sociais em pauta na academia
Tema: Corpos & Identidades
Liga Brasileira de Lésbicas (LBL)
Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR)
Quinta-feira – 27/08/09
LOCAL: Auditório do ILEA
8h30
*

Inscrições
9h
*

Abertura: Profa. Ceres Víctora (PPGAS/UFRGS/NUPACS)
9h30
*

1ª sessão: CORPOS & PODERES
Debatedores: Profa. Zulmira Borges (UFSM) e Prof. Caleb Faria Alves (UFRGS)
*
Apresentações:
Rodrigo de Don Braga (Graduação em Medicina/ULBRA)
Título: Homofobia: Olhares dos estudantes de medicina
*

Priscila de Oliveira Bolzan (Pós-Graduação em Saúde Coletiva/UNISINOS)
Título: Práticas de Saúde entre prostitutas de segmentos populares da cidade de Santa Maria/RS
*

Bianca de Vasconcellos Sophia (Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais/UERJ)
Título: O movimento pró-anorexia e pró-bulimia na internet: uma reflexão sobre as práticas alimentares, saúde e doença, corpo e identidade
*

Daiane Maus Marques (Programa de Pós-graduação em Psicologia Social/UFRGS)
Título: O corpo homossexual na clínica psicológica
*

12h
Intervalo para almoço
*

14h
2ª sessão: CORPOS & RITUAIS
Debatedores: Profa. Maria Eunice Maciel (PPGAS/UFRGS) e Prof. José Otávio Catafesto (UFRGS)
*

Apresentações:
Lige Mara Rauber Bortolotti (Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais/UFSM)
Título: A desconstrução do sujeito mulher: algumas questões para pensar a sexualidade das mulheres no envelhecimento
*

Rodrigo Toniol (Graduação em Ciências Sociais/UFRGS)
Título: O corpo do caminhante e o sentido de saúde da caminhada: um estudo etnográfico entre ecoturistas
*

Jardel Fischer Loeck (Programa de Pós-graduação em Antropologia Social/UFRGS)
Título: Observações gerais sobre a adicção e os grupos de Narcóticos Anônimos
*

Vitor Simonis Richter (Graduação em Ciências Sociais/UFRGS)
Título: Corpo e Mímesis: construção de alteridades
*
16h
Coffee Break
Exposição de pôsters
Comissão julgadora: Profa. Rosana Pinheiro Machado (UFRGS) e Prof. Rafael Devos (UFRGS)
*

17h
Nupacs 20 anos
*

Sexta-feira – 28/08/09
LOCAL: Auditório do ILEA
9h
3ª sessão: CORPOS & SENTIDOS
Debatedores: Profa. Cláudia Fonseca (PPGAS/UFRGS) e Prof. Luiz Fernando Dias Duarte (UFRJ/PPGAS/MN)
*
Apresentações:
Alexandre Peres de Lima (Graduação em Ciências Sociais/UFRGS)
Título: Mulheres e crianças entre os compadres: uma breve incursão na questão de gênero e pessoa dentro das redes de reciprocidade de uma comunidade quilombola urbana de Porto Alegre
*

Lucas Manassi Panitz (Programa de Pós-graduação em Geografia/UFRGS)
Título: Corpo, Paisagem e Identidade: uma contribuição ao tema a partir da música popular platina
*

Cauê Fraga Machado (Graduação em Ciências Sociais/UFRGS)
Título: Doença e cura no Quilombo da Casca: os bons e os maus encontros
*

Paulina Maria Caon (Programa de Pós-graduação em Artes Cênicas/USP)
Título: Educação e cultura corporal em Praia Grande (Vale do Ribeira - SP) - um estudo de caso
*
11h
CONFERÊNCIA DE ENCERRAMENTO
Prof. Dr. Luiz Fernando Dias Duarte
(Museu Nacional - UFRJ)
*
Debate Final
Divulgação do prêmio dos pôsters
*

Inscreva-se!
INSCRIÇÃO – OUVINTE - até 25 de agosto por e-mail ou no local

*

**

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

RBSE - Revista Brasileira de Sociologia da Emoção, v. 8, n. 23, agosto de 2009 - no ar!

*
CONVITE!
*
Convidamos aos amigos visitarem o último número da RBSE – Revista Brasileira de Sociologia da Emoção, v. 8, n. 23, de agosto de 2009 - ISSN 1676-8965. A RBSE é uma revista eletrônica de acesso gratuito do GREM – Grupo de Pesquisa em Antropologia e Sociologia das Emoções. A RBSE pode ser encontrada no seguinte endereço eletrônico: http://www.cchla.ufpb.br/rbse/Index.html.
*
Este número conta com a colaboração de: Mauro Guilherme Pinheiro Koury; Maria Jimena Mantilla; Rachel Irwin; Anne Gabriele Lima Sousa; Renzo Ramírez; Eric Hobsbawn e Angelina Martins.
*
Cordialmente,
*
Mauro Koury
Editor
***
***

INVITATION!
*
We invite the friends to visit the last number of the RBSE - Brazilian Journal of Sociology of Emotion, v. 8, n. 23, August of 2009 - ISSN 1676-8965. The RBSE is an electronic journal of free access of the GREM - Group of Research in Anthropology and Sociology of Emotions. The RBSE can be found in the following electronic address: http://www.cchla.ufpb.br/rbse/Index.html .
*
This issues has contributions of: Mauro Guilherme Pinheiro Koury; Maria Jimena Mantilla; Rachel Irwin; Anne Gabriele Lima Sousa; Renzo Ramírez; Eric Hobsbawn e Angelina Martins.
*
Cordially,
*
Mauro Koury
The Editor

*
**
***